Uma questão:
O que se paga quando se compra uma lente?
A resposta mais direta seria "boa ótica", mas isso não é a verdade, ou pelo menos não é a verdade completa. Por que?
Bem, todo aparelho tem um projeto. Quem já trabalhou com projeto sabe que o projeto é um compromisso entre finalidades hierarquizadas e custo. O que significa finalidades hierarquizadas? Significa escolher o que é importante atender com o projeto em troca do que é menos importante. Esse atendimento, por sua vez, encontra seu dimensionamento pelo custo.
Pois bem, qual o requisito primeiro para uma ótica atual de SLR ou DSLR, isto é, qua o requisito que todas as lentes cumprem? Obviamente o requisito que todas as lentes cumprem, isto é, a hierarquia zero não é um requisito ótico e sim funcional. O primeiro requisito para uma lente moderna é poder interagir com um corpo cujos controles são eletrônicos ou mediados pela eletrônica. Um fabricante hoje não lança no mercado uma lente "burra". Não lança porque formou-se através da propaganda a idéia, em minha opinião errada, que é preciso um corpo com desempenho superlativo em coisas como um milhão de fotos por minuto, comando da lente pelo corpo, fotometria multiponto, etc.
Queiramos ou não, gostemos ou não, o nome que se dá a isso é fotografia automática. É claro que os fotógrafos mais apurados lidam com outras opções, mas como as câmeras são desenhadas para a maioria, e a maioria espera que a câmera tire a foto, elas são projetadas para fazê-lo com pouca intervenção do fotógrafo. Muitos dizem que é preciso ser assim, o que soa como um tipo de desculpa para usar os automatismos, afirmando que "em fotos de esportes", "em fotos sociais", "em fotos assim ou assado", não dá tempo de fotometrar de verdade nem de medir a distância.
Então, como ser capaz desses automatismos é a hierarquia zero, a ótica propriamente desce para segundo plano. Em 1970 comprava-se uma SLR com uma lente 50mm de excelente qualidade como padrão. Hoje compra-se com uma lente variável de ótica sofrível, mas compatível com os automatismos. Qualquer observador desapaixonado vê que o mercado trocou a qualidade ótica pelo automatismo.
Bem, é claro que os automatismos custam dinheiro. Bons motores para comandar o zoom, o autofoco, engrenagens, chips e circuitos nas lentes com CPU, tudo isso custa dinheiro e consome esforço de projeto. Mas isso não é o mais grave. Para poderem ser comandada por motores relativamente fracos os conjuntos óticos devem ser leves. Soluções tradicionais são substituídas por outras que possam ser montadas nesses conjuntos, e, lembro, isso é requisito para poderem existir. Querendo ou não, nas lentes modernas a ótica é contingenciada pelos mecanismos enquanto nas montagens não automáticas os mecanismos eram contingenciados pelas óticas.
Os atributos louvados passam a ser velocidade de autofoco, velocidade de zoom, suavidade do zomm, e a ótca mesma, que afinal é o que define a qualidade da fotografia, fica subentendida como se obviamente fosse boa, mas na verdade, como a lente deve custar um preço razoável e esses itens não óticos são grande parte do preço delas, essa qualidade subentendida não é garantida.
Quanto menos "facilidades" tiver uma lente, mais o preço pago corresponderá à ótica mesma.