Autor Tópico: 2a Clínica de Análise Fotográfica - EXPERIMENTAL  (Lida 9702 vezes)

Ivan de Almeida

  • Trade Count: (1)
  • Referência
  • *****
  • Mensagens: 5.295
  • Sexo: Masculino
  • . F o t o g r a f i a .
    • Fotografia em Palavras
Resposta #30 Online: 22 de Abril de 2009, 18:27:45
Suas fotos são interessantes, Augusto, porque elas mostram uma preocupação em fazer fotografia. Você quis fazê-la nas três, isto é, a fotografia, esse retângulo para o qual olhamos foi sempre o seu objetivo, a tal ponto de secundarizar o objeto na segunda foto (a pessoa está borrada), de tornar um interruptor mal cuidado objeto na terceira, de deixar o balanço de brancos "errado" na segunda. Assim como houve comentários a uma parte dos autores apontando a tendência inversa, isto é, sucumbir ao hipnotismo do objeto, no seu caso isso não houve nem um pouco. Interessante a opção pelo WB errado na segunda foto. É evidentemente errado, e você o propõe como quem diz "dane-se o que é certo, isto é uma fotografia!"

Por certo não vou convidá-lo a abraçar o objeto totalmente, embora a fotografia sempre precisará de um objeto. É preciso cuidado com o grau de desgarramento, pois perde-se a dimensão simbólica da foto. Este é o caso da terceira foto, por exemplo, que é a mais bem resolvida formalmente, e concordo com sua visão do fundo branco separando zonas e servindo de suporte ao interruptor ter funcionado bem. Mas, mesmo com o observador apondo ao interruptor uma imaginação de uso humano, ainda assim o aprofundamento do observador na foto ficará limitado por ausência de jogo simbólico. Tomo aqui como exemplo a foto da Kika da senhora com o quadro. Mesmo não havendo espaço nela, a cena possui simbolismo suficiente para interessar. Exceto em still, a fotografia é um jogo entre forma e signo, e penso que é no terreno do signo que você pode complementar uma abordagem interessante que tem.

Na primeira foto um comentário seu me deixou surpreso... "para esconder uma quantidade de detalhes sem importância". Seriam de fato sem importância? Não há aí um paradigma de higiene formal escondido?

Já no campo da mera opinião, achei a segunda exagerada no amarelo, mas não saberia dizer a dose certa.



Olá, Ivan.
Seguem três fotos com motivos distintos para concorrerem à clínica:
1. Belo Sorriso
Sobre a parede branca compondo parte do fundo do retrato: distrai?
Acredito que o interior da casa, compondo mais da metade, tenha ficado acertadamente subexposto para esconder uma quantidade de detalhes sem importância, enquanto ficou ainda visível o suficiente para explicar o cenário


2. Movimento Iminente
Sobre composição e white balance. Acredito que há uma vasta área sem interesse no quarto superior direito da foto, mas que era importante para ajudar a delimitar o cenário. A luz ambiente já era amarelada e eu, que gosto de tons quentes, tentei preservá-la. Exagerei?


3. Primeiro Interruptor
Sobre composição. Acho que a colocação do primeiro plano no lado esquerdo provoca um passeio "inquieto" do olhar: vemos o objeto principal primeiro, seguimos adiante e, como não há mais nada de interesse, voltamos ao objeto principal. Gostei bastante do emolduramento pela luz de fundo.




Ivan de Almeida

  • Trade Count: (1)
  • Referência
  • *****
  • Mensagens: 5.295
  • Sexo: Masculino
  • . F o t o g r a f i a .
    • Fotografia em Palavras
Resposta #31 Online: 22 de Abril de 2009, 18:54:28
Pedro;

Um formalista! Isto é bom, afinal, fotografia é forma. Assim como o Augusto (besouro), a fotografia é o objetivo. A flor é um álibi, o mar é uma tinta para pintar pela metade o retângulo, o raciocínio é completamente voltado para a forma. O bokeh, atrás da borboleta, tem amis importãncia do que ela mesma, é mais forma do que ela.

É uma tendência bastante interessante.

Além disso, notei uma tendência a dividir as fotos em duas. Uma parte com, outra parte sem, um Ying e um Yang. Assim é na do mar, quase perfeitamente dividida no meio, assim é na flor, onde o fundo, mesmo tendo uma outra flor desfocada é um vazio que ocupa quase metade, assim é a da borboleta, borboleta-fundo. O jogo formal pode ganhar novos níveis de estruturação, sair da organização binária. Talvez isso acrescente espessura às fotografias, evitando que o observador as apreenda muito rapidamente. Por certo aspecto, as obras visuais não podem se oferecer aos observadores tão apreensíveis, pois ele não se enredará na sua lógica. Não é pecado colocar mais elementos nelas -risos.

Escolhi essas fotos porque pretendia passar alguma sensação. Como não é para descrevê-las pois não cabe fazer isso aqui, queria saber se consegui meu objetivo.
Não gosto muito de títulos (porque na verdade não sei escolhê-los), então talvez eles sejam um pouco genéricos :\

1. Fim de tarde


2. Flor


3. Game Over




Ivan de Almeida

  • Trade Count: (1)
  • Referência
  • *****
  • Mensagens: 5.295
  • Sexo: Masculino
  • . F o t o g r a f i a .
    • Fotografia em Palavras
Resposta #32 Online: 22 de Abril de 2009, 18:58:21
Helvio;

Estou com dificuldade de ver suas fotos. Todas estão muito escuras, e não consigo distinguir direito os elementos.

Seria possível postá-las um pouco mais claras?

Abraços
Ivan

Ola Ivan, essa fotos podem ser analisadas em conjunto e o motivo para escolhe-las é que começo por aqui um conceito na minha expressão fotografica, que é a busca de inserir o elemento humano apenas como parte da solução estetica e não como o objeto maior da foto, nessas imagens aproveito para trazer o ludico para as minhas fotos o que as torna especiais porque uno a conceitualização com a experimentação.
Obrigado e parabens por mais uma bela iniciativa.


A Equilibrista


O Contorcionista


A Plateia



Ivan de Almeida

  • Trade Count: (1)
  • Referência
  • *****
  • Mensagens: 5.295
  • Sexo: Masculino
  • . F o t o g r a f i a .
    • Fotografia em Palavras
Resposta #33 Online: 22 de Abril de 2009, 23:08:22
Já o Marcelo ao mostrar, fazer e ESCOLHER as fotos, mostra uma tendência experimental. Por que frisei o ESCOLHER? Porque certamente o autor tem outros tipos de fotografia, mas ao submeter um grupo a uma análise escolhei algo com o qual se identifica e que considera sua vertente mais considerada.

As fotos, assim como as do Pedro, e as do Augusto/Besouro, usam o referente mas não o narram como ele é. Ele é só uma matéria prima, e o resultado nem mesmo atem-se claramente à fotografia como tradição, mas é também uma posição intermediária em que a própria fotografia é pincel. O referente é uma matéria prima, a câmera é um pincel, e o resultado é um experimento estético.

O resultado varia. É um caminho interessante, mas exigente e CARO. Caro em dinheiro? Não. Caro em busca de exatidão, pois é um caminho muito estreito e junto de um precipício que é a anomia, a ausência de regras (não regras externas, mas aquele mínimo regramento que torna uma forma significante). Algumas experiências podem ser interessantes e anomônicas. Então é um caminho caro porque o fotógrafo não pode ceder à novidade, ao fácil, e deve ser o único juiz do seu próprio caminho, visto ser um caminho diferente.

No caso dessas três fotos, vejo na primeira um bom compromisso entre composição e expressão. A segunda pareceu-me estranha, e não consegui estabelecer uma relação com ela. A terceira possui uma proposta sugestiva, e me dá a impresão de uma peça de uma proposta maior.

Um rumo interessante. E difícil.


Olá, Ivan. Bom, você já deve ter percebido qual minha abordagem na fotografia, durante minhas postagens aqui no fóum. A escolha desse tema foi excepcional.

Minha contribuição deriva da intenção experimental, somada à intenção artística. No caso dessas fotos, são apenas minhas leituras de artistas que considero muito: Picasso, Giger e Wahrol.

Violão



Alien´s Dream



Acorde Azul





Ivan de Almeida

  • Trade Count: (1)
  • Referência
  • *****
  • Mensagens: 5.295
  • Sexo: Masculino
  • . F o t o g r a f i a .
    • Fotografia em Palavras
Resposta #34 Online: 22 de Abril de 2009, 23:09:37
Amanhã mais análises.


BesouroLaranja

  • Trade Count: (2)
  • Conhecendo
  • *
  • Mensagens: 67
    • Blog e álbum fotográfico
Resposta #35 Online: 23 de Abril de 2009, 00:38:44
Ivan, agradeço as análises, elas serviram para clarear para mim um caminho que iniciei há pouco; uma tendência a deixar de ser "snapshooter". Como estou muito no princípio, minhas "keepers" são poucas, proporcionalmente às fotos que faço. Tirei muito proveito dos comentários da primeira clínica e dos feitos aos outros autores neste exercício, e a participação em fóruns tem ajudado bastante. Acho muito difícil essa porção da foto: embeber um sentimento na imagem. Eu mesmo sinto essa diferença ao comparar minhas fotos com as de outros. Vou, lógico, continuar tentando.
Sobre a citação do que eu disse na minha primeira foto, acho que eu poderia ter sido mais delicado ao me expressar: "sem importância" deve ser lido como "elementos de distração". Na verdade, reconheci a importância deles quando expressei que contextualizavam a menina.

As fotos do helvio foram postadas em tamanho maior em outro fórum. Pequenas assim, ficaram confusas mesmo, mas funcionam bem quando ampliadas.
« Última modificação: 23 de Abril de 2009, 00:41:15 por BesouroLaranja »
Nikon D50 - AF-S Nikkor 18-55 mm 1:3.5-5.6 - AF-S Nikkor 55-200 mm 1:4-5.6 - Nikkor AI-S 50mm f/1.4
blog e álbum fotográfico




Pedro Harrison

  • Trade Count: (1)
  • Freqüentador(a)
  • **
  • Mensagens: 289
  • Sexo: Masculino
Resposta #36 Online: 23 de Abril de 2009, 00:43:31
Estou acompanhando o tópico, tentando absorver o máximo das análises. Tanto para melhorar o modo como me relaciono com uma série de imagens, em minha própria analise fotográfica, como em minha produção fotográfica.

Pena que cheguei tarde, pois gostaria de ter uma análise atenciosa assim de fotos minhas. Mas, já lendo a proposta, vi o desafio da escolha de 3 fotos que representassem meu momento fotográfico e ajudassem em minha evolução... não seria fácil...

Parabéns pela iniciativa Ivan! :ok:



Ivan de Almeida

  • Trade Count: (1)
  • Referência
  • *****
  • Mensagens: 5.295
  • Sexo: Masculino
  • . F o t o g r a f i a .
    • Fotografia em Palavras
Resposta #37 Online: 23 de Abril de 2009, 01:09:00
Prezados;

Penso haver nessa clínica vários níveis de ganhos possíveis. Percebo que alguns, como o Augusto, a Kika, leram as análises das fotos de outros e as "viveram em si", e assim elas valeram quase como se fossem análises de suas próprias fotos. Porque o que estou fazendo é uma espécie de fenomenologia da minha leitura das fotos, a ao partilhar essa fenomenologia cria-se um mapeamento de diversas maneiras de fotografar, criam-se distinções, e quem vivencia essas distinções as incorpora. Não é porque as minhas distinções sejam especialmente boas, nada disso, mas porque é um campo tão pouco verbalizado que qualquer distinção que se acrescente é útil.

Vemos que nessa clínica estamos construindo uma tipologia; apego ao objeto, formalismo, experimentalismo, registro (palavra muito usada mas sem conteúdo definido como aqui foi), atitude fotográfica, etc. Essas categorias existem em todos nós, em maior ou menor dose, embora na análise da obra de um autor uma dessas características pode se sobressair.

Tento também mostrar um modelo de análise no qual o analista não tenha medo de exprimir seu ponto de vista, de exprimir sua visão pessoal, embora deva fazê-lo dando-se de fato á análise. Não existe análise imparcial/impessoal, então é melhor logo de cara que se saiba ser uma análise enviezada pela personalidade do analista, pois o autor então filtra a análise dando a cada coisa sua dimensão. Repito mais uma vez: quem valida a análise é o autor das fotos ou o leitor. O analista apenas manifesta sua opinião, e se ela é util ou pertinente, isso não é problema do analista, e sim do autor.


Marcelo Voss

  • Trade Count: (0)
  • Membro Ativo
  • ***
  • Mensagens: 574
Resposta #38 Online: 23 de Abril de 2009, 08:35:15
Olá, Ivan. Primeiro tenho que dizer que gostei dessa sua proposta, e, no caso, sua crítica é bem pertinente quanto às minhas fotos.

Segundo, tenho que esclarecer que cometi um erro postando-as aqui, pois, na hora que li EXPERIMENTAL, numa armadilha de raciocínio, achei que o tema dessa sua 2nda cliníca fosse temas experimentais.

E como achei que o enfoque era esse (e venho trabalhando fotos somente com essa abordagem), mal li o resto dos enunciados, tirando os formatos a serem postados.

Fui direto no meu portifólio e comecei a escolher as mais experimentais possíveis. Feito isso, as postei. E depois fui ler os enunciados com mais calma, só então entendendo o que você queria de fato: técnica-estética-poética..

Tentei, ingenuamente, trocá-las, mas vi que você travou esse recurso.

São fotos difíceis mesmo, impertinentes com o que você requisitou. E pior: extremamente microcósmicas no que tange uma estética fotográfica (veja que meus posts aqui no fórum não são comentados por muita gente, salvo quando postei fotos ´normais´).

Bom, é isso. No mais, gostei de ver as fotos comentadas por você. E acho que você deve seguir com essa cliníca, independente de organizar critérios mais sólidos, como sugerem alguns. Até porque 95% das postagens de fotos lá na galeria não me dizem absolutamente nada em matéria de estética sofisticada, desde temas como abordagens como execuções técnicas. Há exceções, claro (qual incluo você).

E para terminar: a segunda foto tentei retratar o hibridismo sugerido por Giger entre alienígenas e humanos. Note que na parte inferior da foto, parece haver um perfil de algo horrendo, com a mancha preta representando os olhos típicos retratados de aliens pelo mundo afora, enquanto na parte superior parece haver um perfil humano, com cabelo exuberante e um olhar resignado. No entanto, a pele do `humano` ja começa a sentir as modificações através da textura gelatinosa que começa a se mostrar na sua face.

Mas como você disse, de forma alguma isso está evidente. Tanto o é, que tive que explicar a foto.

Isso aí

Keep Up The Good Work
`Eagles don`t flock, you have to find them one at a time. ´


Ivan de Almeida

  • Trade Count: (1)
  • Referência
  • *****
  • Mensagens: 5.295
  • Sexo: Masculino
  • . F o t o g r a f i a .
    • Fotografia em Palavras
Resposta #39 Online: 23 de Abril de 2009, 10:19:01
Segundo, tenho que esclarecer que cometi um erro postando-as aqui, pois, na hora que li EXPERIMENTAL, numa armadilha de raciocínio, achei que o tema dessa sua 2nda cliníca fosse temas experimentais.

E como achei que o enfoque era esse (e venho trabalhando fotos somente com essa abordagem), mal li o resto dos enunciados, tirando os formatos a serem postados.

Fui direto no meu portifólio e comecei a escolher as mais experimentais possíveis. Feito isso, as postei. E depois fui ler os enunciados com mais calma, só então entendendo o que você queria de fato: técnica-estética-poética..
Você não errou, Marcelo, acertou. Porque se era a respeito desse tipo de fotos que você queria conversar (pois a análise é menos uma crítica que uma conversa), você foi direto ao ponto, e a mim, como analista, ofereceu um material interessante, e aos colegas como leitores uma visão ampliada do fenômeno fotografia.

Citar
Tentei, ingenuamente, trocá-las, mas vi que você travou esse recurso.
Travamento normal do fórum. Não tenho privilégios especiais de administração, o único privilégio que tenho é poder postar direto na sala de artigos.
Citar
São fotos difíceis mesmo, impertinentes com o que você requisitou. E pior: extremamente microcósmicas no que tange uma estética fotográfica (veja que meus posts aqui no fórum não são comentados por muita gente, salvo quando postei fotos ´normais´).
Não, não. Extremamente pertinentes!
E minha análise, ao fim e ao cabo, pode ser resumida em uma só coisa: "Caminho interessante, mas, dentro dele você precisa construir e dominar uma estética. O caminho pode ser o mais experimental possível, mas isso não o exime de construir uma estética, afinal, fotografia e todas as artes visuais são fatos estéticos"
Citar
Bom, é isso. No mais, gostei de ver as fotos comentadas por você. E acho que você deve seguir com essa cliníca, independente de organizar critérios mais sólidos, como sugerem alguns.
Não haverá critérios sólidos -risos. Sempre será algo desse tipo.
Foi interessante analisar este seu trabalho.

Grande abraço,
Ivan


Ivan de Almeida

  • Trade Count: (1)
  • Referência
  • *****
  • Mensagens: 5.295
  • Sexo: Masculino
  • . F o t o g r a f i a .
    • Fotografia em Palavras
Resposta #40 Online: 23 de Abril de 2009, 13:48:40
1. "Papai do Céu..."

Acompanho a fotografia do Seymor há algum tempo, e ela sempre me deixou perplexo. Por um lado, ela por vezes me parece tão descuidada como um snapshot, por outro, como esta fotografia acima, ela me prende e me deixa meio "bolado". É uma foto imensamente estranha na qual existe uma presença humana que não está nela. A foto não é desabitada, a todo momento parece que alguém pode irromper pela lateral direita e passar pela foto atravessando a porta. Existe alguém, mas não na foto. A foto está torta, impossível deixar de reparar nisso, mas isso não faz diferença.

Por vezes a fotografia do Seymor me parece ser tirada de dentro de si mesmo, como se faltasse a ela uma estética e tivéssemos direto acesso aos seus pensamentos.

O interessante é que a segunda foto, como mesmo tema e "reta", "no prumo", não tem nem de longe a força da primeira, e essa mesma força repete-se na terceira foto. A mão na frente do rosto! É errado! Mas não está errado. Faz parte deste espanto que suas fotos por vezes (nem sempre) apresentam.

Esse equilíbrio entre o snapshot e o surreal do cotidiano foi percorrido por vários fotógrafos, entre eles o Lee Friedlander e o Terry Richardson. Apenas como ilustração, posto uma foto.

Lee Friedlander


De todo modo, é preciso consciência da estética praticada ainda quando não pareça estar presente. Por vezes a fotorafia do Seymor parece-me erratica, embora esse viés apontado sempre esteja nela.

Citar
3. Um dia qualquer


Todas as fotos têm duas coisas em comum: meu momento pessoal e uma tentativa de mudança no processo fotográfico, que se inicou há mais tempo. Quanto ao primeiro aspecto: perdi minha esposa e o bebÊ de oito meses e meio, uma semana antes de marcar a cesárea, há exatamente dois meses e um dia, e o processo está sendo influenciado por isso. Essa influência será permanente? Não sei. Quanto ao segundo aspecto: mudança de proposta, mudança esta que vinha acontecendo, de tornar a fotografia mais pessoal, e que teria na família - esposa e filho(s?) os cúmplices perfeitos. Tenho, apesar desta perda, os amigos que estão cuidando de mim, para continuar esse desenvolvimento.

Abraço, Ivan.





Ivan de Almeida

  • Trade Count: (1)
  • Referência
  • *****
  • Mensagens: 5.295
  • Sexo: Masculino
  • . F o t o g r a f i a .
    • Fotografia em Palavras
Resposta #41 Online: 23 de Abril de 2009, 14:14:29
Olhando as três fotos do Formel é bastante difícil estabelecer uma característica comum entre elas. A primeira foto é uma foto com um objetivo claro, estética relativamente conservadora, composição coerente com a proposta embora não ótima. Parece-me uma composição na qual o fotógrafo usou a memória como referência, uma memória de coisas já vistas. Isso nada tem de mal ou de errado, visto que uma parte de cada fotografia nossa é esse regurgitar de nossas memórias visuais.

Há um princípio analítico que deve ser colocado em relevo, e que permeia todas as análises deste tópico... O autor "fez" as fotos duas vezes, e não só uma. Porque ele fez a foto ao apertar o botão de disparo, sem dúvida, mas ao selecionar a foto para essa clínica ele a "fez" novamente, pois entre muitas a selecionou como questão.

E, assim considerando, ao olhar as três fotos fiquei sem encontrar um ponto comum entre elas. Elas não têm um ponto comum! O que o Formel quis me mostrar? Mudando a pergunta, o que ele me mostrou?

Diria, permitindo-me certa imaginação pela ausência de referências, que o Formel ao escolher essas fotos mostrou-me exatamente aquilo que ele mesmo diz no primeiro parágrafo de sua apresentação das fotos: não ter referência. Porque, como se percebe nas análises anteriores, dá para captar uma tendência de cada autor, mesmo que tênue, quando ele já, semi-consciente dela por vezes, a toma como "sua fotografia".

Por que a segunda foto foi feita e porque foi mostrada? Por que a terceira foto foi feita e porque foi mostrada? Onde está o "ponto"?

Lembro-me, vendo meus filmes feitos entre os 70s e os 80s, que parte de minhas fotos eram desamarradas, e quando olho para elas eu vejo que não tinha compreensão do processo fotográfico como um processo ATIVO. Chamo de processo ativo aquele no qual o fotógrafo entende que ele fará a fotografia, e que se o objeto é interessante ou não, não significa que a fotografia será interessante ou não.

Peguemos um exemplo simples. Imaginem um ovo e um fundo branco. Nada pode ser mais simples do que isso. Como tema, é nada. Mas isso pode ser base para uma boa fotografia? É evidente que sim. Mas tudo estará dependendo da construção da imagem pelo fotógrafo.

Imaginem que qualquer, disse qualquer pessoa pode ser retratada de forma interessante. mesmo a mais desinteressante das pessoas pode ser retratada de forma interessate.

O que poso lhe dizer, Formel, já ai não como analista mas como colega, é que é preciso descobrir a fotografia. Ver fotografias, pensar sobre as fotografias que vê, tentar analisá-las, ampliar a memória visual que ao manifestar-se na primeira foto deu a ela um sentido. Praticar exercícios definidos como "fotografar detalhes", "fotografar sua própria mão de mil maneiras", fotografar uma mesma rua de mil modos, enfom, forçar você mesmo a inventar. É nesse sentido que a fotografia difere das exatas. A fotografia, sendo essencialmente técnica, essa técnica é uma espécie de escrava para aquilo que queremos fazer. E precisamos adquirir uma memória de idéias, não para copiá-las, mas porque a produção humana é um ruminar de um estoque finoto de idéias, sempre revistas, reinterpretadas, refeitas, tornadas novas. Essa memória visual é o lastro, e os exercícios são a forma de trazê-la à prática.



Minha motivação ao postar estas fotos aqui é de ter uma análise mais profundas das fotos que tenho tirado, venho da área de exatas e apesar de estar trabalhando como fotógrafo ainda não me sinto "fotógrafo", talvez ainda me falte sensibilidade ou segurança para me sentir realmente "fotógrafo". Fotografia não é como engenharia, em que é relativamente fácil atestar o conhecimento de um engenheiro, fotografia é um tanto quanto subjetiva e é muito mais difícil saber como estamos nos desenvolvendo como fotógrafos.

Todas estas fotos foram tiradas no mesmo dia. Tem muito pouco tratamento em todas elas, apenas passei para P/B duas delas e a outra puxei um pouco o contraste, não existe corte, está do jeito que vi no visor.

Leitura


Pescaria urbana


Metal e madeira



Pedro Vilas Boas

  • Trade Count: (3)
  • Membro Ativo
  • ***
  • Mensagens: 598
Resposta #42 Online: 23 de Abril de 2009, 15:05:20
O que poso lhe dizer, Formel, já ai não como analista mas como colega, é que é preciso descobrir a fotografia. Ver fotografias, pensar sobre as fotografias que vê, tentar analisá-las, ampliar a memória visual que ao manifestar-se na primeira foto deu a ela um sentido. Praticar exercícios definidos como "fotografar detalhes", "fotografar sua própria mão de mil maneiras", fotografar uma mesma rua de mil modos, enfom, forçar você mesmo a inventar. É nesse sentido que a fotografia difere das exatas. A fotografia, sendo essencialmente técnica, essa técnica é uma espécie de escrava para aquilo que queremos fazer. E precisamos adquirir uma memória de idéias, não para copiá-las, mas porque a produção humana é um ruminar de um estoque finoto de idéias, sempre revistas, reinterpretadas, refeitas, tornadas novas. Essa memória visual é o lastro, e os exercícios são a forma de trazê-la à prática.

Esse trecho ajuda, esclarece, bastante a qualquer mim.

abraços!


pedro_raythz

  • Trade Count: (4)
  • Referência
  • *****
  • Mensagens: 8.465
  • Sexo: Masculino
Resposta #43 Online: 23 de Abril de 2009, 16:01:46
Esse trecho ajuda, esclarece, bastante a qualquer mim.

abraços!

Também me identifiquei... outro dia mesmo fotografava não a minha mão, mas uma rosa. Sempre buscando algo diferente. Inclusive busquei usar P&B para a composição e as formas ficarem mais em evidência...

Ivan, muito obrigado pela análise. É sempre bom ver críticas que falam daquilo que você não enxerga rs
Sempre quando vejo minhas próprias fotos, vejo que falta algo, mas nunca consegui perceber o que era exatamente. Muitas vezes abria o Lightroom ou o Photoshop para tentar compensar essa falta, achando que era algum pós-processamento. Mas não adiantava, sempre acabava fechando e "deistindo" dela.
Agora que você "abriu meus olhos", vou procurar ser mais atento e adicionar mais informação útil a foto. Não vou poluí-la visualmente, é claro, mas tentarei acrescentar mais conteúdo :ok:


Formel

  • Trade Count: (3)
  • Colaborador(a)
  • ****
  • Mensagens: 1.189
  • Sexo: Masculino
    • Formel Fotografia
Resposta #44 Online: 23 de Abril de 2009, 17:10:30
Primeiro quero lhe agradecer pela análise, muito boa sua iniciativa pois eu sentia falta de discussão, não superficial, mas uma discussão tipo aquelas conversas sobre filosofia que só se pode ter em um botequim.

Talvez a única coisa em comum é que essas fotos foram tiradas no mesmo dia em um passeio fotográfico no centro do Rio e sinceramente quando fotografei não tive nenhuma preocupação em compor uma narrativa que ligasse as fotos. Talvez falta de amadurecimento ou deslumbre com o brinquedo, que na época era minha primeira DSLR.

Olhando as três fotos do Formel é bastante difícil estabelecer uma característica comum entre elas. A primeira foto é uma foto com um objetivo claro, estética relativamente conservadora, composição coerente com a proposta embora não ótima. Parece-me uma composição na qual o fotógrafo usou a memória como referência, uma memória de coisas já vistas. Isso nada tem de mal ou de errado, visto que uma parte de cada fotografia nossa é esse regurgitar de nossas memórias visuais.

Essa foi f*da! Tu acertou em cheio! Essa menina, ficou fazendo pose para o pessoal fotografar, até que ela ficou cansada e sentou, o bar era muito bonito com móveis de madeira, lembrando aqueles cafés parisienses de filme de segunda guerra, pois me veio na cabeça aquela foto do Bresson em que um casal se beija em um café com um cachorro aos seus pés, quando ela ficou de saco cheio de ser clicada e começou a ler a revista é que cliquei. Claro que não houve intenção de cópia, até pq não seria possível, mas foi algo que pensei ao vê-la naquela posição. Queria algo menos posado, mais natural, por isso esperei pela distração dela. Diria que foi meio pose meio natural.



Há um princípio analítico que deve ser colocado em relevo, e que permeia todas as análises deste tópico... O autor "fez" as fotos duas vezes, e não só uma. Porque ele fez a foto ao apertar o botão de disparo, sem dúvida, mas ao selecionar a foto para essa clínica ele a "fez" novamente, pois entre muitas a selecionou como questão.

E, assim considerando, ao olhar as três fotos fiquei sem encontrar um ponto comum entre elas. Elas não têm um ponto comum! O que o Formel quis me mostrar? Mudando a pergunta, o que ele me mostrou?

Diria, permitindo-me certa imaginação pela ausência de referências, que o Formel ao escolher essas fotos mostrou-me exatamente aquilo que ele mesmo diz no primeiro parágrafo de sua apresentação das fotos: não ter referência. Porque, como se percebe nas análises anteriores, dá para captar uma tendência de cada autor, mesmo que tênue, quando ele já, semi-consciente dela por vezes, a toma como "sua fotografia".

Por que a segunda foto foi feita e porque foi mostrada? Por que a terceira foto foi feita e porque foi mostrada? Onde está o "ponto"?

Lembro-me, vendo meus filmes feitos entre os 70s e os 80s, que parte de minhas fotos eram desamarradas, e quando olho para elas eu vejo que não tinha compreensão do processo fotográfico como um processo ATIVO. Chamo de processo ativo aquele no qual o fotógrafo entende que ele fará a fotografia, e que se o objeto é interessante ou não, não significa que a fotografia será interessante ou não.

Peguemos um exemplo simples. Imaginem um ovo e um fundo branco. Nada pode ser mais simples do que isso. Como tema, é nada. Mas isso pode ser base para uma boa fotografia? É evidente que sim. Mas tudo estará dependendo da construção da imagem pelo fotógrafo.

Imaginem que qualquer, disse qualquer pessoa pode ser retratada de forma interessante. mesmo a mais desinteressante das pessoas pode ser retratada de forma interessate.

O que poso lhe dizer, Formel, já ai não como analista mas como colega, é que é preciso descobrir a fotografia. Ver fotografias, pensar sobre as fotografias que vê, tentar analisá-las, ampliar a memória visual que ao manifestar-se na primeira foto deu a ela um sentido. Praticar exercícios definidos como "fotografar detalhes", "fotografar sua própria mão de mil maneiras", fotografar uma mesma rua de mil modos, enfom, forçar você mesmo a inventar. É nesse sentido que a fotografia difere das exatas. A fotografia, sendo essencialmente técnica, essa técnica é uma espécie de escrava para aquilo que queremos fazer. E precisamos adquirir uma memória de idéias, não para copiá-las, mas porque a produção humana é um ruminar de um estoque finoto de idéias, sempre revistas, reinterpretadas, refeitas, tornadas novas. Essa memória visual é o lastro, e os exercícios são a forma de trazê-la à prática.


As outras duas eu estava tentando mudar a perspectiva, para não ser muito comum, tinha mais umas quinze pessoas fotografando e eu tentei ignorar o comum e fotografar algo que ninguém estava vendo. Aquela foto do poste foi tirada em frente de uma estátua daquelas em que o cara está sempre montado em um cavalo, então tentei não fotografar as mesmas coisas, como um exercício mesmo. Esse exercício de interpretação eu faço, ou ao menos tento fazer, sempre. Quando eu desenhava fazia muito isso, usava minha mão como modelo e ficava horas desenhando.

Fotografia em vários aspectos se assemelha a literatura, ninguém é escritor pq tem um diploma, ninguém pede para o escritor escrever a necessidade de escrever é do próprio escritor. Acho que ocorre o mesmo com a fotografia, ao menos enquanto arte. Isso ainda gera muita insegurança para eu, pois não é algo que alguém tenha necessidade como demanda é algo mais de quem faz do que para quem é feito, a modelo não precisa de minha foto, eu que preciso fotografar. Sou muito pragmático e talvez por isso ainda não me sinta como fotógrafo.

Eu sinto que preciso conquistar o desejo de outros, acho que só me sentirei fotógrafo quando houver a necessidade de outra pessoa em minha fotografia.

[ ]s

Formel