Ivan, muito interessante o ponto que você levantou e é desse tipo de debate que eu gosto de participar nos foruns de fotografia. Confesso que ao ler a sua resposta fiquei em dúvida se a terapêutica é uma propriedade inerente à fotografia e à arte. Quando você disse que o artista não busca necessariamente lidar melhor consigo através de sua produção, isso faz bastante sentido.
Por exemplo, um fotógrafo poderia dizer que fotografa apenas porque gosta de congelar recortes de uma cena dentro de um retângulo; fotografa apenas porque a luz refletida sobre a superfície terrestre o encanta de forma inexplicável. Eu até poderia argumentar que existe um processo rudimentar de autoconhecimento aí, mas não sei se eu conseguiria levar essa discussão adiante.
Inclusive, foi com esse olhar ingênuo que eu comecei a fotografar. O problema é que a imagem vivenciada ficava desinteressante depois de congelada e enclausurada em um retângulo. Neste instante, percebi que precisaria me esforçar para conseguir reproduzir - em duas dimensões e dentro de uma janela retangular - aquilo que havia gerado em mim tal encantamento. Passei, então, a aplicar "regras" de composição. As fotos pareciam mais bonitas, mas eu não estava ali.
Comecei a ler sobre semiologia e linguagem visual por influência da minha namorada, que estava cursando uma cadeira eletiva na Psicologia (entendeu de onde saiu o meu discurso pró-psicanalítico? :P). Esse momento foi um marco, pois ocorreu junto com o curso que fiz de revelação em preto e branco. Pouco antes, havia começado a frequentar sessões de psicanálise uma vez por semana, e assim comecei a entender um pouco o porquê do meu interesse pela fotografia e por determinada fotografia.
No meu caso, tentar compreender a dinâmica entre a arte e o autoconhecimento funcionou muito bem, pois eu já estava entregando os pontos quando "milagrosamente" comecei a encontrar algo meu, o meu rastro, nas minhas fotografias. À medida que eu aprendo mais sobre mim, a fotografia muda, que, por sua vez, produz novas reflexões, e assim por diante.
Embora eu tenha uma certa tendência a concordar contigo, que sim, a arte não necessariamente está a serviço do autoconhecimento, acho pouco provável que isso ocorra na prática, principalmente nos trabalhos densos de significação. Talvez você não perceba, mas as suas fotografias produzem efeitos "terapêuticos". Se definirmos terapia como "um processo que culmina na cura", e se a cura não é mais do que uma reorganização do simbólico - e creio que essa definição não esteja muito longe da definição psicanalítica de terapia -, então a produção artística é terapêutica quando buscamos chegar a um trabalho significativo, pessoal, autoral, pois para alcançar esse objetivo, precisamos passar por um processo quase alquímico, repetitivo, de produção e absorção. E o que é a alquimia senão a busca pela "pedra filosofal" ou o autoconhecimento?
Não sei se me fiz entender, mas as suas ponderações certamente me fizeram pensar. Abraço!