Os comentários são muito interessantes, pois a maior parte deles mostra uma resistência quase selvagem em tentar ampliar um pouco a visão sobre o que está sendo discutido.
Temos esse artista, o Gravlejs, que, com seu trabalho, mostra como se dá o funcionamento de uma determinada atividade humana. Além de descrever o processo, ele mostra suas falhas e tendenciosidades. Subverte-o de dentro e causa impacto. Portanto, provavelmente sua obra se caracteriza mais como arte do que qualquer fotografia que tenha sido feita pelos seus críticos. O artista, que não engana ninguém, uma vez que revela o processo, nos dá algo em que pensar: na fragilidade da fotografia enquanto descrição da realidade, na inevitabilidade da destruição desse conceito pelas novas tecnologias e, mais importante, na forma enviesada com as informações são produzidas. O jornal quer ter o seu engarrafamento para agradar os seus leitores e a sua linha editorial, que não raro é regida por interesses políticos e econômicos. A manipulação não está na adulteração da foto, a manipulação começa no jornal quando eles dizem ao fotógrafo: "consiga um congestionamento".
O nosso artista, então, que está na posição mais baixa da cadeia, resolve denunciar esse processo. E é claro que é em proveito próprio, como tudo que fazemos. Podemos deixar a hipocrisia de lado. Ele, então, ousa descrever o funcionamento de tudo que está acima. As pessoas, em vez de analisar o que ele está dizendo, reagem com raiva. Ele traiu a confiança, ele enganou, ele cometeu o sacrilégio de atacar os sistema ao qual ele deveria estar placidamente submetido. Sobre o trabalho em si, poucos falam. É melhor fechar os olhos e tapar os ouvidos, pedindo que ele tire da frente essa obra imoral, antiética.
E então opta-se por atacá-lo, por atribuir a ele interesses mesquinhos, por relegá-lo ao esquecimento. Dessa forma, pode-se voltar rapidamente à ignorância, a credulidade cega num sistema em que a fotografia é uma espécie de deus da verdade e a informação é sempre neutra. É muito mais confortável.
E como o Marcelo Voss disse, isso nem é uma grande coisa. A essa altura, já deveríamos entender como as coisas funcionam. Mas, ao invés, preferimos afastar esse tipo de reflexão da mesma forma que espantamos um mosquito que nos incomoda. Preferimos atacar a pessoa a gastar 30 segundos ouvindo o que ele tem a dizer. Sem perceber que, ao fazer isso, fala-se mais sobre si mesmo do que sobre o artista. Alguém aí já leu o Mito da Caverna do Platão?