Autor Tópico: [ARTIGO] Publicidade: podem os fotógrafos lavar as mãos?  (Lida 6647 vezes)

RFP

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Online: 04 de Dezembro de 2010, 11:16:22
Originalmente publicado no Câmara Obscura.

Não é difícil perceber que o preço que a sociedade de consumo cobra pelo conforto e pela tecnologia é alto demais. Podemos encarar essa questão de acordo com diversos pontos de vista. Em relação à ecologia, vemos que, embora os alertas em relação ao meio ambiente já estivessem sendo dados há muito tempo, só mais recentemente começamos a sentir as consequências. Há também um ponto de vista social, no qual argumenta-se que o modelo econômico baseado no consumo como é hoje acentua as diferenças entre as camadas da população. Do ponto de vista ideológico, afirma-se que o sistema capitalista, que tem o consumo como seu motor, impede que a democracia ou a igualdade sejam plenas.

Todos esses pontos de vista são válidos. No entanto, eu, como psicólogo, interesso-me por como os mecanismos da sociedade de consumo afetam a vida dos indivíduos e o seu bem estar. Hoje, não somos vistos como cidadãos, ou como indivíduos, e sim como consumidores. Se nos compararmos com as pessoas de dez, vinte ou cinquenta anos atrás, percebemos facilmente que consumimos muito mais. Os itens de consumo duram cada vez menos e são substituídos cada vez mais rapidamente. Isso é facilmente perceptível olhando para o intervalo entre os lançamentos entre câmeras dos principais fabricantes. As primeiras Nikon F ficaram em produção por 10 anos. Agora, vejamos quantos modelos são lançados em apenas um ano. A questão é: somos mais felizes do que a dez, vinte ou cinquenta anos?


Candice Wouters

Não somos, porque toda a questão do consumo depende disso. Se fôssemos mais felizes, consumiríamos menos, o que não pode acontecer. E qual o fator determinante para que não estejamos satisfeitos, tendo tanto conforto e tecnologia à disposição. Não quero ser reducionista, mas acredito que um dos fatores fundamentais é a publicidade. Basicamente, a publicidade, para atingir seus objetivos, precisa nos imbuir de uma sensação de falta, falta essa que só será suprida com um produto. Ou seja, os anúncios implicam o tempo todo no fato de que não podemos ser felizes, nem satisfeitos – a menos que consumamos. No entanto, se o consumo realmente fosse suficiente para nossa satisfação, não precisaríamos continuar consumindo tanto, e teríamos mais satisfação. Acontece que é muito difícil nos satisfazermos com posses materiais, inclusive porque a própria publicidade nos diz que o que acabamos de comprar já não é mais suficiente.

Quem trabalha com publicidade geralmente tem alguns argumentos contra essa percepção. Diz-se, por exemplo, que o marketing e os anúncios apenas refletem aquilo que o consumidor quer e que não se criam necessidades, apenas descobrem-se. No entanto, o que vemos na prática é diferente. As pessoas chegam a extremos para perseguir um padrão alardeado pela mídia que é simplesmente inatingível. Vejo também nos pacientes que atendo a angústia por não conseguir se encaixar em certos modelos midiáticos. Podemos perceber que a publicidade não está apenas nos anúncios, mas nas novelas, filmes, revistas e programas de TV em geral, constantemente criando modelos que as pessoas tendem a seguir. E não só as pessoas que não os atingem que sofrem. Nos raros casos em que as pessoas conseguem, por um momento, sentir-se dentro do padrão, isso também causa angústia e ansiedade tremendos, pois é dificílimo manter esse nível irreal de exigência. Basta ver quantas modelos são acometidas por transtornos alimentares. Então, quando os publicitários dão de ombros e negam ter todo esse poder sobre as pessoas, penso que é uma tremenda hipocrisia. Se não tivessem, não seriam gastos milhões e milhões em publicidade. Campanhas de marketing não raro custam mais caro do que os custos de produção de certos produtos: pagamos mais pelo anúncio do que pelo item em si.


Alex Glickman

Como esses modelos são basicamente visuais, a fotografia tem um papel importante. É através dela que se criam as ilusões dos produtos e vidas ideais que geram o consumo. No entanto, por que, ao fazer uma foto publicitária, não basta ir até o supermercado mais próximo e fotografar o produto? Por que é necessário ter estúdios com esquemas complexos de luz, flashes, lentes e câmeras caríssimas, pós-produção etc? Porque o produto real, que está na prateleira do supermercado, não é suficiente. É preciso ir além, criando uma imagem perfeita, ultrarreal, cuja função é eliciar o desejo e salientar a sensação de falta no observador.

Pode o fotógrafo lavar as mãos em relação à sua contribuição para esse sistema? É claro, ele irá argumentar que não foi ele que determinou que as coisas sejam como são, e que está apenas fazendo o seu trabalho. Ou, ainda, que se ele não fizer, outro fará. É claro que eu não tenho o direito de julgar a forma como as pessoas ganham suas vidas, ainda mais quando se trata de um trabalho honesto. Muitas vezes nem temos clareza das dimensões que a nossa atividade profissional pode atingir numa perspectiva mais ampla. Não obstante, acredito que existam algumas pessoas que têm uma visão crítica sobre o estado de coisas, sobre o modelo social em que vivemos. Que percebem, ainda, que podemos mudar muito pouco do sistema através do voto, já que os candidatos viáveis são aqueles comprometidos com o poder econômico e que a máquina governamental é desenhada para se limitar a escolhas menores. Para essas pessoas, talvez valha a pena refletir se adianta reclamar do governo ou culpar os outros. Uma das alternativas se dá através da análise do próprio meio de vida, considerando como ele afeta as pessoas e a si mesmo. E aí, se você for um fotógrafo publicitário e ao mesmo tempo alguém preocupado com as outras pessoas e com a sociedade de forma geral, talvez valha a pena parar para pensar. Você pode ter mais poder nas mãos do que imagina. O que você vai fazer com isso?

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P.S.2: Esse artigo foi inspirado no texto free of advertising, do blog mnmlist (em inglês).


Fotocom

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Resposta #1 Online: 06 de Dezembro de 2010, 15:44:00
- Meu amigo a real culpa é da pequenez humana... No passado ela era (parecia) menor pois existiam menos coisas p/se ver... Com o advento da TV as possibilidade dos sonhos só aumentaram... Mas o principio é sempre o mesmo  AS VAIDADES HUMANAS... Lógico sempre existiu no SER HUMANO a eterna busca pelo + o maior o melhor o ultimo tipo... Isso tbm é um combustível social.

- Nos ultimos 50 anos o mundo mudou mais do q nos ultimos 4000 anos, mas as pessoas são as mesmas (oq mudou foi o mundo a volta)... A ganância, o PODER, a inveja e etc são sentimentos q sempre acompanharam a humanidade Desde o principio...
- Quem seria então o grande culpado ????

- Somos livres p/fazermos nossa escolhas, o triste é esta obrigatoriedade, tens de escolher...

Ex; Jogo de futebol... Qual é o teu time?
- Nem um...
- MAs como assim, ou tu és Inter ou Grêmio ( Moro em Porto Alegre )
- Nem um...
- Não mas vc tem de ter pelo menos alguma simpatia por um ou pelo outro...
- Nem um...
- Ta mas então tu gosta de algum time do interior?
- Nem um...
- Ahhhh então tu não gosta é de futebol???
- Gosto.
- Mas não torce p/nem um ????
- Nem um...

- O futebol é a maior paixão deste país, e por conta disto vc é obrigado a escolher algúm, pois assim vc se torna parte do coletivo, e se vc escolhe algúm invariavelmente o outro se torna o adversário (inimigo).
- Quando se para p/ver os valores da questão.
- Temos um IDOLO o camisa 10 o goleador, que nada mais é que um garoto com habilidade de chutar uma bola, ele repete constantemente a palavra HUMILDADE e no entanto sai do treino dirigindo um CARRO de 1milhão
Ele veio de uma classe humilde, mas ja mora em um palacio, dizem sempre ter muito orgulho da cor, mas no entanto casam sempre com mulheres de cor inversa...

- Este garoto (muleque) é IDOLO, e os admiradores (torcedores) olham com carinho e dizem;
 "Esse é o cara, era pobre subiu na vida e sabe das coisas... E a prova disto é a HUMILDADE dele..."

PS; A proposito, qual é o teu time????

Abração!!!!


rahmati

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Resposta #2 Online: 10 de Dezembro de 2010, 13:53:21
Lógico sempre existiu no SER HUMANO a eterna busca pelo + o maior o melhor o ultimo tipo... Isso tbm é um combustível social.

Não acho que seja tão simples assim. Veja a segunda foto, as senhoras nela. Lembra-se das pessoas mais velhas pedindo alguma vez algo porque é mais novo? Não, certo? É uma questão quase cultural. Contudo, concordo que houve sempre uma busca pelo poder, que hoje é sintetizada no poder econômico, como o era no poder dominador - na Roma de Nero, por exemplo.

Em relação ao artigo, claro que seria louvável, por exemplo, fomentar um movimento contra essa obsolencência programada, mas, eu pergunto - seria possível, nessa sociedade hoje tão individualista?
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RFP

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Resposta #3 Online: 11 de Dezembro de 2010, 10:05:35
Em relação ao artigo, claro que seria louvável, por exemplo, fomentar um movimento contra essa obsolencência programada, mas, eu pergunto - seria possível, nessa sociedade hoje tão individualista?

Não podemos dizer às pessoas como elas devem viver suas vidas, tampouco devemos impor um ponto de vista. Acho que a questão, para quem deseja algum tipo de mudança, é preocupar-se consigo mesmo e fazer o que julga correto, sem esperar ou exigir dos outros que façam o mesmo.


AugustoL

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Resposta #4 Online: 19 de Janeiro de 2011, 14:48:13
Do ponto de vista ideológico, afirma-se que o sistema capitalista, que tem o consumo como seu motor, impede que a democracia ou a igualdade sejam plenas.

Antes de terminar de ler seu texto preciso fazer esse comentário. Isso aí não é verdade. Recomendo a leitura de textos de Norberto Bobbio sobre teoria democrática. Se tivesse com meu exemplar aqui, podia t indicar até livro e capítulo, mas como não estou.........

« Última modificação: 19 de Janeiro de 2011, 14:57:06 por AugustoL »
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