Tentando refocar no assunto do tópico:
O que o Diogo argumenta é que o filme é uma coisa física, o digital é virtual, não existe fisicamente. Este é um dos pontos "mágicos" do filme pois, sendo físico, pode ser admirado. Cultuado. Mas isto (culto) eu deixo para os fanáticos, que não é o caso de ninguém que esteja lendo isto.
O grande lance do filme é que ele é analógico. A mesma coisa que LP e CD. Na década de 70, pra ganhar uma graninha, eu era DJ, dava festas. Tudo com LPs, claro. Quando o CD apareceu numa grande feira aqui em São Paulo, eu corri pra ouvir esta maravilha da qual todo mundo falava. Dois stands da feira tinham filas enormes para suas salas de audição: Sony e Philips, os criadores do CD. Fiquei na fila; chegou a minha vez; entrei na sala; as portas se fecharam e começou uma música clássica, depois um jazz, uma MPB - faltou Disco. Depois da audição eu dei uma olhada no equipamento para checar a equalização. A minha conclusão, após ouvir nos dois stands e conferir que as equalizações estavam ok, permanece até hoje: mas que m@#%*! Falta grave! Não tem chiado, mas falta grave.
O LP está de volta, a cerca de R$ 150,00 cada, e vendendo bem! O número de títulos só aumenta, podem conferir na Livraria Cultura, por exemplo.
A diferença das tecnologias é básica: um é uma linha reta de um ponto a outro, o outro é uma escadinha que tenta simular a linha reta. Um é o corrimão, o outro os degraus da escada. E a melhor definição que ouvi até hoje é: "Quando o digital for capaz de simular todas as nuances do analógico, ele será analógico". Você terá um corrimão numa rampa.
São duas mídias diferentes, com capacidades diferentes e ponto final. Já vi excelentes trabalhos em digital que me fizeram pensar que haviam sido feitos em filme.
Mas nunca vi um trabalho em filme que parecesse feito em digital. E é isso que me atrai para o filme. Ele é ele. Ele tem personalidade. Tanto que a tecnologia moderna o tenta simular. A imitação é a mais sincera forma de admiração, diz o ditado inglês numa tradução livre.
O rital do filme me agrada mais. Tem o mistério e a gratificação. Envolve uma conquista, um sentimento de realização que o digital não apresenta.
O grão do filme me agrada mais que o pixel. É orgânico, aleatório, único, inimitável. Se você gastar um filme tirando fotos de uma parede com um motor drive, todas sairão iguais, mas nenhum grão de nenhuma imagem estará na mesma posição. Cada imagem tem sua impressão digital - sem trocadilhos...
Eu não gosto de me comunicar com mensagens gravadas; nem por e-mail ou MSN. Prefiro ligar para a pessoa. Falar com uma pessoa. Acho mais humano.
Por isso eu prefiro filme. Tenho que sair de casa, ir até uma lojinha, ter contato com outro ser humano. E novamente, depois de 1 ou 2 horas, me relacionar com outro ser humano novamente para obter minhas imagens.
Comece a prestar atenção: a modernidade e todos os seus recursos e facilidades de comunicação serviu para nos afastar mais uns dos outros, criar novas tribos, nichos, grupos isolados que ficam olhando para os seus umbigos e achando que a vida é aquilo.
Como isto é altamente sem graça, o que acontece? O culto ao passado onde a vida era mais que apertar botões. O culto ao vintage. As pessoas se vestem vintage, usam penteados vintage, relógios vintage, carros vintage, máquinas (de filme ou digitais com look) vintage, compram motos vintage, mas continuam no seu isolamento, apertando botões, fazendo de conta que estão vivendo a vida.
Hoje chegam ao cúmulo de ir a um show, ficar filmando no celular pra assistir em casa e curtir DEPOIS!!! C A R A C A ! ! ! ! Ao invés de verem os fogos de reveillon na varanda ficam vendo pela TV. As pessoas estão se tornando virtuais.
É por isso que eu curto filme.
Nada contra o digital, que é uma mídia que tem suas qualidades, seu valor, sem dúvida nenhuma. Mas, pra mim, não dá pra curtir. O processo não tem nenhum charme, nenhum grande desafio. Para mim, é trabalho, é retoque de imagem. Dependendo da sua capacidade no Photoshop, os resultados são ótimos.
Para ilustrar, uma historinha:
tem um "fotógrafo" aqui em São Paulo, muito famoso no Brasil inteiro, que se vangloria de clicar as maiores celebridades, ter as câmeras mais modernas, os computadores mais top que você possa imaginar. Ele realmente acredita que é o máximo.
Um cliente (uma universidade) o contratou direto para fazer fotos dos seus Campus. A diretora de arte encarregada do trabalho começou a receber as imagens. Depois da quinta vez que ela pediu alterações e nada dava muito certo ela veio me pedir auxílio pois sabe que eu curto muito fotografia.
Os retoques eram esquisitos, as luzes não batiam. Perguntei se ela havia acompanhado as fotos. Ela falou que sim. Perguntei como foram feitas as fotos. Olhem só: a criatura chega lá, sem luz NENHUMA, faz uma foto com tripé e pronto. Ela comentava com ele que estava escuro, ia perder muitos detalhes. A resposta: "Ah, o resto a gente arruma no computador". Eu falei que não dá pra retocar uma foto se você não tem a foto, melhor fazer em 3D.
OITO (8) meses depois eu saí da agência e o processo de retoques continuava.
Outra historinha para ilustrar o oposto:
a foto mais tranquila que eu já fiz na vida foi com o Luis Crispino. Chegamos ao Estúdio Abril, o set já estava armado conforme o layout. Ele perguntou se queríamos alterar alguma coisa. Não, estava ok. Um Polaroid 4x5 para checar a luz. Perfeito. Click! 1 hora depois saíamos de lá com o cromo 4x5 debaixo do braço felizes da vida. É a prova de FILME PODE SER BEM MAIS RÁPIDO QUE DIGITAL. Quem sabe, sabe.
É por isso que eu CURTO filme.
Espero não ter entediado vocês.
Abraços,
José Azevedo