Não sei se concordo muito com isso de que o valor da obra tem a ver com o fato de que ele fez e ninguém antes tinha feito. Gente, tem muita gente boa e talentosa por aí e que talvez nunca venha a ter reconhecimento. Quem é que pode ter certeza que ninguém nunca teve a mesma ideia antes e não produziu algo parecido? Basta dar uma volta pelo flickr e vamos encontrar muitas fotos parecidas com essa aí. Até melhores, inclusive. Pra mim, é questão de ter contatos, de divulgação... de marketing. Algumas pessoas tem sensibilidade e talento, mas nenhuma disposição para essas coisas práticas que ajudam no reconhecimento público.
Oi Aria,
Acho que eu me expressei um pouco mal; não tive a intenão de ser tão simplista assim nas minhas afirmações, resumindo o valor da obra ao quanto ela tem de diferente do resto. É muito mais do que isso. Talvez alguém, de fato, tenha tido a mesma idéia e produzido uma, ou algumas imagens parecidas.
Mas será que esse alguém tem um trabalho sólido, consistente, uma linguagem particular desenvolvida ao longo de anos, com centenas de imagens que dialogam entre si, ou só uma ou outra foto parecida com essa imagem no seu arquivo? O valor do trabalho do Gursky não é, simplesmente, a beleza plástica ou estética das suas imagens.
Ele não é um fotógrafo iniciante; já é um senhor com quase 60 anos, que há mais de 10 ou 15 figura entre os fotógrafos contemporâneos mais admirados e vistos, cujas obras têm aumentado significativamente de valor e ganho cada vez mais espaço nos mais renomados museus de arte contemporânea do mundo inteiro. Me intriga muito entender a razão disso.
Acredito que não; não se trata de discutir se os trabalhos seriam aprovados ou rejeitados em nosso Corredor Polonês (até mesmo porque são fotografias de grande formato, impressas em tamanhos gigantes; um jpeg de 800 pixels é apenas uma mera idéia do que elas representam). A questão, pra mim, é diferente. Esse cidadão já fotografou o mundo inteiro (inclusive São Paulo) e qualquer um que tiver a oportunidade/interesse de pesquisar sobre as obras dele, vai perceber que, muito mais do que fotografias de São Paulo, Paris, Berlim, Estocolmo, ou onde quer que seja, são imagens do Andreas Gursky. Indiscutivelmente.
Vou tentar explicar um pouco melhor o que eu quero dizer: qualquer livro do Sebastião Salgado, qualquer imagem dele, tem muito mais a cara do fotógrafo do que do lugar/assunto fotografados. Não importa se a foto foi feita na África ou no sertão nordestino. É muito mais fácil identificá-la como uma imagem do Sebastião, do que como uma fotografia da África ou do sertão. Imediatamente; basta deitar os olhos sobre a imagem e já sabemos que foi ele quem fez.
Com o Gursky, acontece a mesma coisa. É muito mais fácil identificar qualquer das imagens como um trabalho de autoria dele, do que como um retrato de um lugar qualquer. As fotos dele, assim como um quadro do Van Gogh ou do Picasso, ou uma fotografia do David LaChappelle, são facilmente identificáveis como tal; não é nem preciso colocar o nome do artista na parede do museu.
Lembrei agora do Bruce Gilden, um fotógrafo de rua que eu admiro bastante. Vendo as imagens desse cara, antes de pensar "que foto legal de nova iorque", ou, "que imagem bacana de tokyo", a primeira coisa que vem na mente é: "ah! olha a foto do Bruce Gilden!". As imagens dele até ganharam o apeldido de "Gildens", assim como as do Gursky são chamadas de "Gurskys".
É quase como se o fotógrafo se tornasse o fotografado, tamanha a sua capacidade de se fazer presente na imagem!Concluindo, porque já to me alongando demais, pode ser mesmo que numa volta pelo Flickr encontremos muitas imagens parecidas com algumas imagens de todos esses fotógrafos que eu falei acima. Mas será que os donos desses portfólios têm tantas imagens, tão consistentes e que guardem uma identidade tal entre si, que nós seríamos capazes de identificá-las como fotos deles (assim como identificamos Gurskys, Salgados, Bressons, Gildens, Haasses e Erwitts), ou são apenas autores de diversas fotografias bonitas?
Posso responder por mim: depois de quase quinze anos fotografando, acho que só agora estou começando a conseguir colocar um pouco de mim nas imagens; alguma coisa que as torna identificáveis como minhas para quem já conhece boa parte do que eu já produzi. Foto bonita, que passaria com louvor pelo corredor polonês, modéstia à parte eu acredito que já faço há tempos. E não vejo grandes méritos nisso, porque todos nós somos capazes de dominar a técnica e nos colocar diante de cenas bonitas para registrá-las.
Criar um trabalho autoral sólido, com visão particular, distinta e consistente são outros 500. O Gursky não faz imagens bonitas de aves, carros de corrida, prédios ou natureza. Ele faz fotografia autoral e eu acredito que a fotografia autoral dele é muito, mas muito bem feita, por todos os motivos que eu citei acima.