Algumas informações para vcs refletirem um pouco...
Acho que todos aqui sabem onde moro. Não vou falar aqui nesse post para poder me preservar...
Bem... Trabalho na Procuradoria Jurídica de uma Autarquia Estadual. Fazemos fomento à instalação de indústrias no estado.
Lido diretamente com 2/3 episódios desses todo ano. Não tão grande como esse caso específico, mas porque não deixamos chegar a esse ponto. Mas digo a vcs: é tudo muito complicado. TUDO!!!!!
Não vou falar diretamente desse caso porque não conheço as minúcias, mas poso relatar, sem indicar locais e empresas um caso bem “interessante” que ocorreu no segundo semestre do ano passado.
Tínhamos reservado um grande terreno à beira de uma importante rodovia estadual que liga a região metropolitana, o porto e uma importante rodovia federal (ponto estratégico para recebimento/despacho de produtos, seja internamente seja para o exterior, seja via marítima, seja via terrestre, seja via aérea) para quando tivéssemos o interesse de alguma importante indústria se instalar aqui.
Apareceu uma indústria de química fina especializada em perfumes e cosméticos e muito conhecida nacionalmente. Negociamos a instalação dela nesse terreno. Assinado o Protocolo de Intenções entre Governo do Estado e a Diretoria da tal indústria, naturalmente foi noticiado na imprensa a vinda da empresa e citou-se o local onde se construiria a fábrica.
Em 2 dias o terreno estava todo tomado!!!!
Eram caminhões de gente sendo despejadas lá. Fizeram piquetes, demarcaram as “propriedades”, levantaram cabanas de lona preta e plantaram uma bandeira por lá. Tinha um bando de crianças, idosos, mulheres e muitas grávidas.
Conseguimos a liminar de reintegração de posse em 48 horas depois do Jurídico da Autarquia ser acionado.
Demoramos mais de 1 mês para conseguir reintegrar. Por quê?????
Vocês não fazem idéia das negociações que envolveram essa reintegração. Com o passar do tempo foram chegando as informações. O movimento “social” era conduzido, a uma distância segura EVIDENTEMENTE, por um Deputado Estadual. A Casa Civil do Estado teve que negociar com o cara para conseguir a desocupação. A Casa Militar só iria se a Casa Civil liberasse. O Governador só liberava se tivesse TUDO comprovado que a retomada era correta. Tivemos que fazer mais provas para a Casa Civil do que para a própria Ação de Reintegração de Posse. Nesse meio tempo, o juiz que havia concedido a liminar, e que conhecia a causa, saiu de férias. A juíza substituta cassou a liminar. Conseguimos restituir os efeitos da liminar no Tribunal de Justiça do Estado em tempo recorde. Vai esse que vos escreve levar a cassação da cassação da liminar para a juíza. A juíza tomou chá de sumiço. Pediu afastamento de 8 dias para tratar da saúde, com Atestado Médico antecipado (rsrsrsr). Não tinha ninguém para receber o ofício do Tribunal. Demoramos 3 dias para esperar o juiz original da causa voltar de férias. Conseguimos restituir os efeitos da 1º liminar. Conseguimos liberação da Casa Civil. Conseguimos o destacamento da PM para acompanhar (P2, Cavalaria, Tropa de Choque, Oficialato... serviço completo). Cadê o Oficial de Justiça???? rsrs O cara disse que só ia com ordem direta do juiz. O circo já todo armado, liga para o juiz... Um funcionário nosso que conhecia todo o histórico do terreno (proprietários anteriores, delimitações, desapropriação, ano da desapropriação, valores, etc...) conversa mais de30mins com o juiz e ele (juiz) se assegura que de fato o terreno é nosso.
Dada a ordem, entram o Oficial de Justiça com os Oficiais da PM e a P2. Explicou-se como seria a desocupação. Cadê caminhões e caminhões para colocar todos os pertences desse pessoal para serem retirados. Um cara lá retirou os cabos das velas de um caminhão e deixou o caminhão bem no meio da única estradinha que dava acesso ao interior do terreno, numa tentativa desesperada de impedir a retomada.
Bom, para encurtar a história, ao fim deu tudo certo. Ninguém ferido. Todos os pertences de valor foram retirados por nós e devolvidos aos seus próprietários. Não foi preciso usar cavalos, nem cães, nem bombas de efeito moral, gás de pimenta, nem tiro de borracha...
Mas o que mais me doeu foi saber da boca de uma velhinha que estava lá que ela tinha pago R$125,00 reais pela “propriedade” dela e pagou mais R$300,00 para o organizador da invasão tomar conta e não deixar ninguém “tomar o que era meu porque eu não podia dormir aqui”.
DETALHE: O terreno, por Lei, é inservível para moradia. É área industrial e NUNCA uma invasão poderia/poderá ser legalizada. Temos bairros inteiros aqui que reclamam teus Títulos de Propriedade. Entra Governador, sai Governador e eles nunca conseguirão. Não só por impedimento legal, mas por uma questão bem simples na verdade... Quem será o Governador que assentará uma determinada população em uma área industrial sujeita a escapamento de compostos perigosos para a saúde? E se um assentamento desses, vamos dizer 5.000 pessoas, inalar um gás mortal? Quem quererá se responsabilizar por isso????????
Não conheço a realidade do caso desse tópico. Mas muitas e muitas vezes as coisas não são tão simples quanto se aparenta. Mas em uma coisa concordo com todos. Houve imensa falta de humanidade. Há formas e formas de se fazer a mesma coisa. O Governo aí escolheu a forma mais truculenta. Aqui um dia também já foi assim. E aqui muitos sentem saudades desses dias.
Ufa... Me alonguei demais. Espero que me perdoem.
EDIT: Editei separando o texto para dar maior conforto na leitura.