"A gente olha e pensa: quando aperto? Agora? Agora? Agora? Entende? A emoção vai subindo e, de repente, pronto. É como um orgasmo, tem uma hora que explode. Ou temos o instante certo, ou o perdemos para sempre."
Obviamente que voce reconhece este texto de Henri Cartier-Bresson, falando das suas fotografias, ou deste texto de Ansel Adams:
"Achava o que queria fotografar, fazia a composição e então esperava pela luz e circunstância adequadas. Não raro isso significava esperar por dois ou três dias.".
Ambos dissera exatamente o que eu disse, com outras palavras. O Adams, que voltava várias vezes ao mesmo local, o que ele fazia se não perseguir conscientemente a idealização inicial? Isso é método, transpiração, intelecção, análise.
O Bresson, idem, você não colou o texto todo, pois antes ele diz que reconhece a geometria local (diz-se em várias entrevistas "um geômetra"), compõe (atos racionais e de planejamento", e depois fica esperando acontecer uma determinada configuração COM OS ELEMENTOS MUTÁVEIS DA COMPOSIÇÃO, POIS O RESTANTE JÁ ESTÁ DEFINIDO, que seja, "o orgasmo".
A técnica do Bresson é claramente essa, e eu antes de ler esse trecho dele já sabia que era, e pratiquei várias fotos usando-a. Compunha, esperava com a foto composta o evento significador. É uma técnica soberba, especialmente para fotografia de rua, pois sempre podemos na fotografia de rua contar com a presença humana (no mato não, fica mais de uma hora sem passar ninguém na estrada).
Querer que "emoção" responda por tudo é o mesmo que não querer evoluir. Desculpe-me a franqueza. Arte, qualquer arte, é TRABALHO. Trabalho significa esforço metódico e racional sobre um tema. Emoção é uma palavra difícil de usar, pois a vagueza do seu significado é enorme. Digamos que os valores emocionais sejam somente a parte evocativa, para facilitar a conversa.
O imaginário sobre a arte é muito diferente do que é a arte propriamente. O Corvo, do Edgard Alan Poe, um dos mais famosos poemas escritos, foi confessadamente fruto de planejamento metódico. Ele pegou uma idéia inicial e lapidou, com métodos específicos que sabia que seriam os adequados (onomatopéias, repetições, etc). Não ficou "inspirado" e fez. Planejou e fez. Declarou isso, dizendo ter planejado fazer um poema que seria importante na história da poesia e que "projetou" o poema.
Eu mesmo, embora faça poemas bastante ocasionalmente e xexelentos, por vezes faço poemas que são planejamento quase puro, e quem lê acha que são emocionados. Uma idéia (a tal inspiração), às vezes uma frase, e depois uma construção gramatical/semântica/ritmica mais ou menos controlada.
TODOS, digo TODOS os grandes poetas passam a vida modificando seus poemas, pois percebem que há imprefeições na construção. Isso nada tem a ver com isnpiração e emoção.
Ficar pendurado nessa palavra cujo significado é tão vago é o mesmo que abrir mão da busca, pois a busca é feita de insistência, repetição, trabalho continuado.
Bem, Paulo. Até agora conversei com você imaginando que você queria realmente investigar o assunto, pois declarara que não tentava. Mas cria-se um paradoxo: se não tentava, como pode ter idéias tão sólidas e inamovíveis sobre ele? Assim, parece que você ao invés de tentar lançar-se em tentativas artísticas, como declarou querer, adotou a solução mais simples de redefinir a palavra arte para ela ajustar-se ao que já faz. Assim fica meio inútil prosseguir com esta conversa, pois deixa de ser INVESTIGAÇÃO e passa a ser argumentação.
Investigação é aquilo que se dirige a algo que não sabemos e queremos saber. Argumentação é insistir naquilo que achamos saber. Você me disse anteriormente que despertara para o problema da arte na fotografia, isso sugerindo INVESTIGAÇÃO, mas quando as idéias circulam você argumenta para manter a mesma posição anterior. Aí fica sem sentido.