Dizem que pensar é a essência do homem, mas no meu ponto de vista, quem disse isso se referia a tomar decisões em horas extremas, o que decidia entre a vida e a morte, não via essa frase oriúnda de um filósofo como Arístocles, sentado embaixo de uma árvore, com seus alunos, pensando em respostas, para mim, seria mais um Diógenes, cercado por uma multidão enfurecida, tendo que proferir palavras que fossem mais forte que o ódio ou a ignorância, quando não, uma fusão desses dois.
Para minha sorte, tive alguns dias de muita tensão para pensar, e pensar, até cansar, até não mais conseguir conter o fluxo de pensamentos, e sua mente que antes era contida pela represa do seu controle, estoura, e te revela que você não controla nada.
O estresse era tamanho, que pensei que tivesse enlouquecido, primeiro, foi a tensão da decisão que me levou até aquela situação, depois, de levar uma surra, isso aumentou mais ainda a aflição, o nervosismo era visível, e ao tentar disfarçar isso ficava ainda pior, estar ali, com pessoas reclusas, triplicava tudo isso, e as necessidades humanas, como sono, sede e banheiro levaram-me ao extremo, posso dizer que eu era um bruxismo ambulante, e faltava um milimetro para romper todos os dentes.
O banheiro sempre foi algo complicado, por mais humano que seja, uma hora, o corpo toma o controle, mas ali, no meio de um monte de pessoas estranhas, não, isso era o menor dos meus problemas, mas, era algo que me preocupava, poderia ficar alguns dias sem comer, e até sem ir ao banheiro, mas, e se precisasse? Não sei por quê, mas, era lgo idiota a se pensar, mas pensava, e se? Como seria, a que horas, provavelmente de madrugada, quando estivessem dormindo, mas e para dar descarga? Precisava parar de pensar, tinha que me concentrar em outras coisas, como, o que farei quando encontrar o Balaço?
Como me justifico? E se ele não for de conversa? Se vier e me der um tiro, sem conversar? E se me levarem para longe? E se algum desses aqui da cela, estiver realmente encrencado e resolve se vender para aliviar um pouco sua pena, ganhar moral com ele?
Era um xadrez mental, infinitas jogadas, possibilidades, desfechos, tive mais de 48 horas para pensar, o banheiro era o menor dos meus problemas, percebi que isso era minha mente tentando deixar o assunto de lado, para esfriar, quando jogava video-game ou algum outro jogo, não conseguia sair de alguma situação, dava um tempo, e logo, a mente, de alguma forma, trabalhava aquilo, e depois, conseguia avançar e superar os obstáculos.
Resolvi desencanar, comecei a ver isso como um jogo, onde não sabia as regras, não tinha manual, era a última ficha em uma máquina que eu nunca havia jogado.
Com essa associação, a mente começou a trabalhar, me lembrei então de um campeonato de Street, valia uma grana boa, daria para livrar o aluguel de três meses de um quarto que alugava em uma casa de família, precisava ganhar, decidi então, que faria algo bem diferente, sairia da caixa, dos padrões, faria de um jeito tão inesperado que deixaria meus oponentes desorientados.
Faria o mesmo com Balaço, já tinha arquitetado meu encontro com ele e planejado exatamente o que iria dizer.
Depois da "tonfada" na costela, respirar era se torturar, é dificil pensar com dor, com sono, com fome, e com aquele puta medo de morrer, para mim ali era o tudo ou nada, não tinha cartas boas, e a banca, tinha todas as vantagens.
Balaço berrou:
Tá fodido moleque, vou te "aleijar", não vai sair daqui andando, se sair...
Devia ter feito o que mandei, porra, entregar a escada, nada disso teria acontecido, mas não, tinha que ter me "peitado", é fioti, cê cagou na sua vida ao se meter comigo, seu bosta.
Olhei pra ele, estava com muito medo, as pernas queriam tremer, mas a descarga de adrenalina era muito forte, achei que fosse ter uma parada cardíaca, ali, lascado, olhei para ele com cara de "Matar ou morrer" e sussurei:
— Seguinte, sou um merda, um fodido, se tiver que fazer o que tem que fazer, faça logo, me fará um favor, na moral, aquele dia lá, se você tivesse chegado mais tarde, eu estaria sozinho, e na boa, teria feito de um modo beeem diferente, ah mano, vou te contar antes de você me apagar.
Faço uma cara de "Don Corleone", e solto:
—Te colocaria para dormir, igual fiz, foi fácil, você é leve, pequeno, lento, só que na sequência, teria te amordaçado, te colocado de costas, apoiado uma toalha dobrada na sua cervical, bem entre a C4 e a C7, e dali, te golpearia com a borda de uma anilha de 25kg, até sentir seus ossos se estilhaçarem, com sorte, ficaria tetraplégico, depois disso, te cegaria, é fácil com luz de solda que uso para reparar alguns equipamentos, em seguida, perfuraria seus tímpanos, aqueles arames de desintupir esgoto dariam conta, a galera da academia caga grosso sabe, para finalizar, retiraria sua língua com um alicate de bico, usaria o ferro quente, ou a vara da solda mesmo, para cauterizar e estancar qualquer hemorragia, tudo isso para te manter vivo, mas privado de seus sentidos, apenas a consciência, para refletir durante toda sua semi-existência, que aquele que tem o poder da lei em suas mãos deveria fazer melhor uso dela...
(derrepente, um insight: isso sim seria a prisão sem muros ideal, não o da Caverna do Dragão, pensei).
Seria a maneira fácil para mim, mas para meu azar, haviam testemunhas no local, e deste modo, não poderia de forma alguma executar esse plano que me passou entre você me ameaçar e colocar a mão na sua arma.
Fui obrigado a escolher o caminho mais complicado entende? Então "senhor policial" vulgo, Balaço, aproveite que a hora é agora, se me matar pode alegar legítima defesa, mas se liga só rapá, fora lesões corporais, não tenho nenhum outro processo, tá ligado? Já o senhor, autoridade, pelo que me consta tem vários problemas com a corregedoria, é mermão, tô sabendo, caso resolva enfiar uma bala na minha cabeça ou onde for, me dá até satisfação em pensar que se me apagar, eu possa ser a gota de água que vai fazer seu copo de sujeira transbordar, ao menos terei servido de algo, e na boa, tô começando a gostar da ideia.
Levantei, abri os braços e gritei:
Tenho é porra nenhuma a perder, foda-se toda essa merda, foda-se você, o sistema e sua corrupçao!
O cara não acreditava no que acabava de ouvir, sua cara no início era de arrogante e poderoso,agora me olhava como se eu fosse um louco, seus olhos de espanto eram enormes, nunca passou pela cabeça daquela cara que alguém, em sua carreira, lhe diria aquilo, percebi que ele não sabia o que dizer ou o que fazer, sem dizer nada, nenhuma palavra, para minha incredulidade, ele saiu da sala.
Voltou com o delegado, nisso, chega junto meu amigo, o advogado bronzeado, com minha "soltura" em mãos, após isso, respondi em liberdade pela agressão e pelo furto ( é, cai como receptador... ) de uma escada, por outro lado, fui "aconselhado" pelo advogado e pelo delegado a não prestar queixa contra os presos pela agressão e que se fosse assim, tudo estaria certo, mas isso era o que menos me preocupava, o que minha mente não parava de pensar era em uma coisa, retaliação da parte do Balaço, um cara daquele, ruim como o demônio, não iria engolir isso fácil...Mas isso é um outro capítulo.
Não existe razão, apenas circunstâncias favoráveis entre a loucura e a sanidade.