Autor Tópico: Desculpe-me, meu amigo, mas sua fotografia não é tão boa…  (Lida 4798 vezes)

pkawazoe

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Abri esse tópico pq vi esse texto do Ivan de Almeida
no blog que ele escreve, excelente por sinal.

aqui o link
https://fotografiaempalavras.wordpress.com/2009/11/04/desculpe-me-meu-amigo-mas-sua-fotografia-nao-e-boa/


Não, não… Desculpe-me, amigo, mas sua fotografia não é boa. Ou não e tão boa quanto crê ou quanto lhe dizem ser…

Embora seja algo chocante isso dito acima, é a realidade e é aplicável à imensa maioria das fotografias que circulam na rede em Flickr, fóruns, etc, que são mostradas e louvadas como boas fotografias.

É bastante interessante como a fotografia digital estipulou requisitos diferentes para uma fotografia ser considerada boa. São tantas fotografias que vemos todo dia e muito poucas destacam-se da massa, muito poucas deixam rastros em nossa memória. Ao contrário, essa massa termina por engolir e soterrar fotos que são, afinal, boas em muitos sentidos, têm boas cores, são tecnicamente corretas, nítidas, bem expostas, mas são mais uma entre tantas parecidas.

Recentemente, em um debate em um fórum de fotografia, excelentes fotografias feitas na década de setenta foram usadas como exemplo na conversa que se levava, algumas magníficas fotografias de futebol foram consideradas pelos debatedores menos boas, até mesmo ruins. Por que? Porque o filme rápido usado na época exibia grãos – e hoje detesta-se ruído. Porque as fotos não estavam perfeitamente em foco ou os movimentos perfeitamente congelados – e hoje existe foco contínuo e ISOs altos “limpos”.  O que elas tinham de extraordinário foi ignorado pelos debatedores, foi soterrado pela visão atual na qual certas características técnicas muito dependentes da tecnologia embarcada na câmera são colocadas na frente de outras tantas características autorais, da força da imagem, sobretudo, de sua narrativa.

A palavra autoral, alias, é entendida de forma muito peculiar. É atribuída àquelas fotografias nas quais o fotógrafo, quando profissional, faz tentando ser artista, esquecido que a arte na fotografia é sempre completamente dependente do refinamento de seu discurso por imagens, não de uma atividade especial “artística” apartada de sua produção normal. Hoje vemos as fotografias do Doisneau feitas para a Renault e achamos nelas a graça e a arte do Doisneau, o traço inconfundível de seu discurso visual. São fotografias publicitárias, mas nelas há a inconfundível força da fotografia que encontramos no O Beijo. São fotografias publicitárias e são autorais, são claramente emergentes de uma visão fotográfica particular. Não há dicotomia: são ao mesmo tempo publicitárias e autorais.

Contudo, parece que na produção normal atual essa abordagem pessoal, essa visão pessoal, essa autoria é desnecessária e até evitada. A autoria, a abordagem autoral é vista, parece, como uma função de um computador que se pode habilitar ou desabilitar. O fotógrafo funcionaria em dois “modos”: o modo profissional e o modo autoral, e nesse último ele “pega uma compacta ou câmera de filme e sai por aí dando vazão ao fotografar que realmente gosta”.  Naturalmente não é assim, pois pessoas não são computadores, ou quando fazem-se de máquinas sacrificam algo de si, e a autoria reprimida pelo anseio de produzir algo perfeitamente dentro dos cânones da estética banal dos meios de comunicação de massa termina por contaminar toda a produção. Não existe o “modo autoral”. Ou se é autor sempre, ou nunca.

Dorothea Lange produziu sua fotografia trabalhando. E a produziu porque não se limitou a fazer o que lhe foi encomendado. Não deixou sua humanidade em casa nem vestiu a camisa de perfeito funcinário da câmera. Fez o que lhe foi encomendado de uma forma única.

Mas tão poucas fotos vemos onde há discurso visual definido, que o o correto, o corretíssimo seria dizer o dito no título deste artigo: “sua fotografia não é boa”. Isso significando que ela não é nada além do comum, além daquilo que olhamos e esquecemos, que preenche o lugar do discurso visual clichê onde nenhum ponto de vista do autor se percebe. Não significa ela não ser bem feita e também contar um sem número de perfeições técnicas. Significa apenas não ser nada além daquilo que se vê toda hora.

Alguns sinais distintivos podem ser citados para saber se as fotos destacam-se do resto.

O primeiro, refere-se à trajetória do autor. “As fotos de fulano, têm um quê particular, característico dele?” Isso não significa serem perfeitas. Aliás, é irrelevante serem perfeitas a menos que o gênero exija perfeição. Significa haver nas fotos de fulano um depoimento visual característico e forte suficientemente para nos lembrarmos dele. Significa que suas fotos são um depoimento a partir de sua forma de ver o mundo.

O segundo sinal refere-se ao aprofundamento em algum assunto. Isso não é um exato sinônimo do sinal anterior, embora seja coisa parecida ou ocorra junto muitas vezes, pois também há fotógrafos que têm fixação em um tema mas apenas produzem os clichês do assunto, mesmo quando muito bem feitos.

Porém, significa que, dentro do ethos da fotografia, o autor procura seus espaço autoral fazendo fotografia, fazendo a fotografia de seu gênero de predileção ou de trabalho, e não tentando fazer arte. Fazer arte não faz parte do ethos da fotografia, hoje estou convencido disso. Mas manifestar um discurso visual de autor sim. Não existe fotografia de boa qualidade sem essa manifestação de autoria. A arte? Essa pode ser identificada à posteriori, mas na fotografia nunca será a mesma arte das Artes Plasticas, e quando se tenta fazer atrtes plásticas pela fotografia não é mais fotografia. A fotografia torna-se tão somente meio, e a produção ignora a questão fotográfica mesma.

É preciso lembrar que o Ansel Adams apenas tentou produzir boas paisagens. Chamar sua produção de arte é ato posterior de terceiros e isso não orientou sua produção.

Assim, o fotógrafo equilibra-se , consciente ou inconscientemente, entre dois grandes perigos, entre duas anulações. De um lado, a anulação da autoria, do outro a anulação da fotografia. De um lado ele é puro funcionário do dispositivo (Flusser), um repetidor de imagens médias do universo de imagens contemporâneas. Do outro ele é artista plástico que usa a fotografia, pois perdeu sua conexão com o ethos da fotografia.

Talvez a coisa mais importante seja distinguir entre a boa fotografia e a fotografia meramente correta. Essa distinção pode ser impossível para o iniciante, mas é essencial mais além. Quem não distingue ficará retido em um nível onde será louvado exatamente pelo cumprimento de modelos, não por sua narrativa por imagens, por seu depoimento através da fotografia. Quem é prisioneiro de todas as opiniões nada cria, e quem não leva nenhuma em consideração torna-se alienado do mundo. Mas não há muito como fugir do fato de que, para se produzir fotografia autoral no bom sentido, qual seja, produzir fotografias que atendendo ao seu propósito expressem também uma visão de mundo definida, é preciso em grande dose saber quais as opiniões deve-se ouvir, e saber quando não se deve ouvir opinião alguma.

A criação fotográfica em algum momento nos remeterá àquela nossa solidão essencial, e termos de, diante de uma fotografia que não atende perfeitamente a ideia de boa fotografia afirmá-la como obra e dizer: esta é a minha fotografia! Aqui estou dizendo algo, algo de minha maneira de ver a existência. E sustentar essa afirmação contra o mundo que cobrará dela o cumprimento de modelos. Nesse momento, o criador estará sozinho contra um mundo hostil, tão mais hostil quanto maior for o afastamento entre a sua criação e os modelos normais.

O criador terá razão ou apenas estará tomado por um sonho alienado? Para isso não há resposta. É uma resposta que será dada pelo tempo, pela aceitação gradativa de suas fotos. E não necessariamente a aceitação provirá dos meios fotográficos com que convive.

Ou se aceita isso, ou apenas se fará a fotografia do funcionário do aparelho, aquela que será muito bem aceita e louvada, mas esquecida.


« Última modificação: 17 de Maio de 2023, 00:00:59 por pkawazoe »


felipemendes

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Resposta #1 Online: 17 de Maio de 2023, 11:27:43
Texto interessante, já prevejo uma boa discussão. Vou digerir e já comento.


Jose Eduardo

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Resposta #2 Online: 17 de Maio de 2023, 19:25:42
A maioria das fotografias que vemos hoje em dia são apenas comuns, nada além do que já estamos acostumados a ver. Principalmente pelo fato de que, ao tornar a fotografia comum ao público, qualquer pessoa pode gerar registros em qualquer momento, basta ter um celular. As fotografias já não despertam interesse, porque elas seguem os padrões estéticos estabelecidos, sem transmitir uma visão única, aliás, é aqui que mora o diferencial fotográfico, hoje é tudo "mais do mesmo" (não significa que estejam errados). É preciso distinguir entre uma fotografia comum e uma fotografia com narrativa. A verdadeira qualidade está na autenticidade e na narrativa visual, não apenas nas características técnicas. É a manifestação do discurso visual do autor que faz uma fotografia se destacar.


pkawazoe

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Resposta #3 Online: 18 de Maio de 2023, 20:45:38
já prevejo uma boa discussão

eu tbm espero..... :ok:


pkawazoe

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Resposta #4 Online: 18 de Maio de 2023, 20:47:00
A maioria das fotografias que vemos hoje em dia são apenas comuns, nada além do que já estamos acostumados a ver. Principalmente pelo fato de que, ao tornar a fotografia comum ao público, qualquer pessoa pode gerar registros em qualquer momento, basta ter um celular. As fotografias já não despertam interesse, porque elas seguem os padrões estéticos estabelecidos, sem transmitir uma visão única, aliás, é aqui que mora o diferencial fotográfico, hoje é tudo "mais do mesmo" (não significa que estejam errados). É preciso distinguir entre uma fotografia comum e uma fotografia com narrativa. A verdadeira qualidade está na autenticidade e na narrativa visual, não apenas nas características técnicas. É a manifestação do discurso visual do autor que faz uma fotografia se destacar.


Eu vejo a internet como um “mar” é muita informação, não apenas imagens, então aquilo que é importante, aquilo que é interessante se perde na imensidão da banalidade, hoje em dia é preciso aprender a buscar informação, mas as vezes coisas interessantes caem no nosso colo, é o tao do algoritmo, ele serve tando para esconder informação e vender produtos, mas tbm para direcionar um conteúdo interessante, o problema é que a banalidade vem junto e é preciso o bom censo para filtrar.


pkawazoe

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Resposta #5 Online: 18 de Maio de 2023, 20:52:36
Aqui meu 50 cents sobre o assunto.

Eu acho todo fotografo tem um ego um pouco maior que o restante das pessoas, afinal ele quer mostrar a sua fotografia e receber elogios por ela, o chamado tapinha nas costas, mas de repente alguém fala que vc faz foto de florzinha e o seu egozinho fica machucadinho, como  pessoa lida com isso demonstra a maturidade dela.

Essa egolatria fotográfica aparece em diversos tipos de pessoas, o cara que tem 30 anos de fotografia, o sujeito que tem um cargo importante e acha que sua fotografia tbm é importante, a pessoa que recebe elogio da mãe, dos amigos, a namorada, esposa, etc, aquele que recebe curtidas no face, insta.

Tudo isso alimenta o efeito Dunning–Kruger

E como a gente evita isso?

Talvez conhecendo as nossas próprias limitações, a gente sabe o que conhece mas não sabe o que não conhece.
Será que deu pra entender?
 
As pessoas em geral acham que sabem mais do que realmente sabem, e em um total desconhecimento sobre aquilo que lhes falta, compreender as suas deficiências é tão importante quanto as qualidades.

Ex: todo mundo sabe que luz e composição é uma das coisas mais importantes na fotografia, mas do seu tempo que vc dedica a fotografia quanto dela vc gasta para aprender sobre luz e composição, quanto vc gasta para sair e tirar fotos e quanto vc gasta aprendendo sobre equipamentos?

E para se melhorar na fotografia, o que se deve priorizar?


felipemendes

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Resposta #6 Online: 19 de Maio de 2023, 01:11:56
Eu acho todo fotografo tem um ego um pouco maior que o restante das pessoas, afinal ele quer mostrar a sua fotografia e receber elogios por ela,

Eu diria que, por toda a humanindade, artistas em geral foram assim. Hoje em dia a maioria das pessoas é assim, de uma forma ou de outra. Talvez pelo tempo das redes sociais, em que se posta coisas esperando um "Curtir".

Mas eu também acho que nem toda a arte está destinada à grandeza, e está tudo bem com isso. Nós, como humanos, nos organizamos em pirâmides: pra cada mil medíocres (medianos), poderá haver 100 bons, 10 excelentes e um genial. Mas dificilmente o genial seria genial se não existissem os mil medíocres. Tudo bem com isso. Fazendo um paralelo com a música, eu ficaria bem ansioso se toda música que eu ouço fosse uma obra-prima. Aliás, "obra prima" sigifica a primeira, a melhor. Não dá pra tudo ser o primeiro, o melhor.

Quanto a ser autoral, achei simplista a colocação. Pra mim, autoral é somente seguir alguns preceitos daquele personagem que se quer representar. Cada projeto pode ser executado por um personagem diferente do mesmo fotógrafo. Você (Paulo) já mostrou aqui diversos dos seus projetos (personas): teve sua exposição "Conexões", e tem seus estudos de composição. Pra mim, são projetos diferentes, e ambos autorais em estilos diferentes. Novamente fazendo uma analogia com a música, seria o Damon Albarn com o Blur e com o Gorillaz. Duas premissas completamente diferentes. Além disso, tem aquele dia em que a gente sai de casa com horário certinho, pra fazer o feijão com arroz. Eu, pelo menos, também ficaria bem ansioso se toda vez que eu fosse fotografar, me sentisse pressionado a fazer minha obra prima naquele dia.

Pra tirar essa pressão do peito, eu sempre aceito que minha fotografia não é boa. O dia que for boa, não serei eu a primeira pessoa a saber.


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Resposta #7 Online: 19 de Maio de 2023, 16:04:07
Penso de maneira bem particular... Não estou nem aí se gostam ou não das minhas fotos, fotografo para mim, porque eu gosto, mesmo porque não ganho dinheiro com isso (nem nunca quis). Ego é para quem vive de exposição e da opinião dos outros.

Lembrando o óbvio, que a divisão entre o que muitos consideram arte é bem subjetiva, somando com os trilhões de fotos cliché ou simplesmente para registro de momentos ou documentais, tem muito assunto para ser discutido. Obviamente para quem gosta de discutir sobre essas coisas. Eu prefiro me divertir, fotografar o que gosto sem ter que dar satisfação a ninguém e muito menos ligar para as opiniões dos outros.

Mas tem o caso do profissional, que se não for bom no que faz aí ferrou, vira mais uma gota no oceano e isso é meio caminho andado para uma vida profissional completamente frustrada.

E concordo plenamente que tem muitos fotógrafos que se acham e o trabalho realmente é bem mais ou menos, isso para ser educado...

Fotografia autoral demanda conhecimento, domínio da técnica e um contexto, coisa que não tenho visto muito ultimamente. Inclua nisso que gosto é totalmente subjetivo.



Leonardo Tonin

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Resposta #8 Online: 19 de Maio de 2023, 16:39:14
Quando no texto brilhante fala que o fotógrafo então pega uma compacta de filme e sai para fotografar o que gosta, me parece justamente falar disso. De fotografar em um nível de honestidade consigo mesmo. Posso estar falando besteira. O texto dele é muito bom.

« Última modificação: 19 de Maio de 2023, 16:42:14 por Leonardo Tonin »


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Resposta #9 Online: 21 de Maio de 2023, 04:59:53
   O elogio e a critica são importantes, e claro que existem aspectos negativos no ser humano. Tambem e bom entender, que existe competição, mas pode ser saudável, ninguém precisa passar por cima.
O que pra mim, e importante o fotografo ter algum grau de satisfação em seu processo de aprendizado, considerando ter chegado em uma foto boa, em uma primeira camada de percepção. Sem um pouco dessa satisfação, qualquer atividade que requeira disciplina torna se um castigo. O prazer de fotografar o que gosta.
   Em uma segunda camada de percepção, temos sim a critica, os conselhos, onde a opinião do outro pode contribuir.Dar algum toque não e fácil, pode incomodar quem esta se expondo. Mas eu nao acho que tenha apenas aspectos negativos. Nao concordando, não de ouvidos. O que eu acredito que o Ivan de Almeida apontou, no entanto e a critica mais vinculada a tecnologia dos produtos, do que ao ensino.  No meu entender, esse foi um ponto que fez algumas pessoas abandonar a fotografia, e passou a usar mais o telefone. Por isso, acho importante quando estamos em meios virtuais muito abrangentes, selecionar o que voce pode considerar apropriado para voce e o que nao e dentro da area que voce tem interesse, de acordo com seu modo de pensar.






« Última modificação: 21 de Maio de 2023, 05:13:55 por Leonardo Tonin »


pkawazoe

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Resposta #10 Online: 25 de Maio de 2023, 11:46:26
Eu diria que, por toda a humanindade, artistas em geral foram assim. Hoje em dia a maioria das pessoas é assim, de uma forma ou de outra. Talvez pelo tempo das redes sociais, em que se posta coisas esperando um "Curtir".

Mas eu também acho que nem toda a arte está destinada à grandeza, e está tudo bem com isso. Nós, como humanos, nos organizamos em pirâmides: pra cada mil medíocres (medianos), poderá haver 100 bons, 10 excelentes e um genial. Mas dificilmente o genial seria genial se não existissem os mil medíocres. Tudo bem com isso. Fazendo um paralelo com a música, eu ficaria bem ansioso se toda música que eu ouço fosse uma obra-prima. Aliás, "obra prima" sigifica a primeira, a melhor. Não dá pra tudo ser o primeiro, o melhor.

Quanto a ser autoral, achei simplista a colocação. Pra mim, autoral é somente seguir alguns preceitos daquele personagem que se quer representar. Cada projeto pode ser executado por um personagem diferente do mesmo fotógrafo. Você (Paulo) já mostrou aqui diversos dos seus projetos (personas): teve sua exposição "Conexões", e tem seus estudos de composição. Pra mim, são projetos diferentes, e ambos autorais em estilos diferentes. Novamente fazendo uma analogia com a música, seria o Damon Albarn com o Blur e com o Gorillaz. Duas premissas completamente diferentes. Além disso, tem aquele dia em que a gente sai de casa com horário certinho, pra fazer o feijão com arroz. Eu, pelo menos, também ficaria bem ansioso se toda vez que eu fosse fotografar, me sentisse pressionado a fazer minha obra prima naquele dia.

Pra tirar essa pressão do peito, eu sempre aceito que minha fotografia não é boa. O dia que for boa, não serei eu a primeira pessoa a saber.

Penso de maneira bem particular... Não estou nem aí se gostam ou não das minhas fotos, fotografo para mim, porque eu gosto, mesmo porque não ganho dinheiro com isso (nem nunca quis). Ego é para quem vive de exposição e da opinião dos outros.

Lembrando o óbvio, que a divisão entre o que muitos consideram arte é bem subjetiva, somando com os trilhões de fotos cliché ou simplesmente para registro de momentos ou documentais, tem muito assunto para ser discutido. Obviamente para quem gosta de discutir sobre essas coisas. Eu prefiro me divertir, fotografar o que gosto sem ter que dar satisfação a ninguém e muito menos ligar para as opiniões dos outros.

Mas tem o caso do profissional, que se não for bom no que faz aí ferrou, vira mais uma gota no oceano e isso é meio caminho andado para uma vida profissional completamente frustrada.

E concordo plenamente que tem muitos fotógrafos que se acham e o trabalho realmente é bem mais ou menos, isso para ser educado...

Fotografia autoral demanda conhecimento, domínio da técnica e um contexto, coisa que não tenho visto muito ultimamente. Inclua nisso que gosto é totalmente subjetivo.

   O elogio e a critica são importantes, e claro que existem aspectos negativos no ser humano. Tambem e bom entender, que existe competição, mas pode ser saudável, ninguém precisa passar por cima.
O que pra mim, e importante o fotografo ter algum grau de satisfação em seu processo de aprendizado, considerando ter chegado em uma foto boa, em uma primeira camada de percepção. Sem um pouco dessa satisfação, qualquer atividade que requeira disciplina torna se um castigo. O prazer de fotografar o que gosta.
   Em uma segunda camada de percepção, temos sim a critica, os conselhos, onde a opinião do outro pode contribuir.Dar algum toque não e fácil, pode incomodar quem esta se expondo. Mas eu nao acho que tenha apenas aspectos negativos. Nao concordando, não de ouvidos. O que eu acredito que o Ivan de Almeida apontou, no entanto e a critica mais vinculada a tecnologia dos produtos, do que ao ensino.  No meu entender, esse foi um ponto que fez algumas pessoas abandonar a fotografia, e passou a usar mais o telefone. Por isso, acho importante quando estamos em meios virtuais muito abrangentes, selecionar o que voce pode considerar apropriado para voce e o que nao e dentro da area que voce tem interesse, de acordo com seu modo de pensar.



Acho que dá pra responder todo mundo aqui.....então vamos lá.

Na minha opinião o Ego nunca anda sozinho, ele sempre está acompanhado do orgulho e da vaidade, quando produzimos uma imagem que a gente gosta de uma certa maneira dá um pouco de orgulho e a nossa vaidade nos impulsiona para mostra lá para alguém e o ego tem a expectativa do elogio, isso não é só com a fotografia mas com coisas do nosso cotidiano, como um texto que escrevemos, ou algo que a gente conserta em casa, ou aquela ideia no trabalho, etc

Mas eles em si não são propriamente ruins, dependendo do contexto em que eles são aplicados, e podem ser a força que impulsiona  a sua fotografia. E isso está ligado a jornada fotografia de uma pessoa. Nós passamos por várias fases ao longo do nosso caminho, tem a descoberta da fotografia, o aprendizado, os projetos e depois mais aprendizados, ai a gente descobre que não sabe muito e volta para o aprendizado, e em todo esse tempo a gente faz fotografias ruins, boas e excelentes e depois descobre o que o bom era ruim e o excelente era mais ou menos, e o ego, a vaidade e o orgulho?  Eles sofrem mais ou menos dependendo da maturidade em que a gente se encontra.

O quão bom nós nos tornamos não depende exclusivamente da quantidade de informação que nós temos, repertório não é o mais importante na fotografia.
Talvez uma outra coisa que a gente adquire durante a nossa jornada.

Vou deixar mais um texto, um do Rubem Alves que explica o que eu penso.


A COMPLICADA ARTE DE VER
 
Ela entrou, deitou-se no divã e disse: “Acho que estou ficando louca”. Eu fiquei em silêncio aguardando que ela me revelasse os sinais da sua loucura. “Um dos meus prazeres é cozinhar. Vou para a cozinha, corto as cebolas, os tomates, os pimentões – é uma alegria!
Entretanto, faz uns dias, eu fui para a cozinha para fazer aquilo que já fizera centenas de vezes: cortar cebolas. Ato banal sem surpresas. Mas, cortada a cebola, eu olhei para ela e tive um susto. Percebi que nunca havia visto uma cebola. Aqueles anéis perfeitamente ajustados, a luz se refletindo neles: tive a impressão de estar vendo a rosácea de um vitral de catedral gótica.
De repente, a cebola, de objeto a ser comido, se transformou em obra de arte para ser vista! E o pior é que o mesmo aconteceu quando cortei os tomates, os pimentões… Agora, tudo o que vejo me causa espanto.”
 
Ela se calou, esperando o meu diagnóstico. Eu me levantei, fui à estante de livros e de lá retirei as “Odes Elementales”, de Pablo Neruda. Procurei a “Ode à Cebola” e lhe disse: “Essa perturbação ocular que a acometeu é comum entre os poetas. Veja o que Neruda disse de uma cebola igual àquela que lhe causou assombro: ‘Rosa de água com escamas de cristal’. Não, você não está louca. Você ganhou olhos de poeta… Os poetas ensinam a ver”.
 
Ver é muito complicado. Isso é estranho porque os olhos, de todos os órgãos dos sentidos, são os de mais fácil compreensão científica. A sua física é idêntica à física óptica de uma máquina fotográfica: o objeto do lado de fora aparece refletido do lado de dentro. Mas existe algo na visão que não pertence à física.
 
William Blake sabia disso e afirmou: “A árvore que o sábio vê não é a mesma árvore que o tolo vê”. Sei disso por experiência própria. Quando vejo os ipês floridos, sinto-me como Moisés diante da sarça ardente: ali está uma epifania do sagrado.
Mas uma mulher que vivia perto da minha casa decretou a morte de um ipê que florescia à frente de sua casa porque ele sujava o chão, dava muito trabalho para a sua vassoura. Seus olhos não viam a beleza. Só viam o lixo.
 
Adélia Prado disse: “Deus de vez em quando me tira a poesia. Olho para uma pedra e vejo uma pedra”.
Drummond viu uma pedra e não viu uma pedra. A pedra que ele viu virou poema.
Há muitas pessoas de visão perfeita que nada vêem.
 
“Não é bastante não ser cego para ver as árvores e as flores. Não basta abrir a janela para ver os campos e os rios”, escreveu Alberto Caeiro, heterônimo de Fernando Pessoa. O ato de ver não é coisa natural. Precisa ser aprendido.
 
Nietzsche sabia disso e afirmou que a primeira tarefa da educação é ensinar a ver. O zen-budismo concorda, e toda a sua espiritualidade é uma busca da experiência chamada “satori”, a abertura do “terceiro olho”. Não sei se Cummings se inspirava no zen-budismo, mas o fato é que escreveu: “Agora os ouvidos dos meus ouvidos acordaram e agora os olhos dos meus olhos se abriram”.
 
Há um poema no Novo Testamento que relata a caminhada de dois discípulos na companhia de Jesus ressuscitado. Mas eles não o reconheciam. Reconheceram-no subitamente: ao partir do pão, “seus olhos se abriram”.
 
Vinicius de Moraes adota o mesmo mote em “Operário em Construção”: “De forma que, certo dia, à mesa ao cortar o pão, o operário foi tomado de uma súbita emoção, ao constatar assombrado que tudo naquela mesa – garrafa, prato, facão – era ele quem fazia. Ele, um humilde operário, um operário em construção”.
 
A diferença se encontra no lugar onde os olhos são guardados. Se os olhos estão na caixa de ferramentas, eles são apenas ferramentas que usamos por sua função prática. Com eles vemos objetos, sinais luminosos, nomes de ruas – e ajustamos a nossa ação. O ver se subordina ao fazer. Isso é necessário. Mas é muito pobre.
Os olhos não gozam… Mas, quando os olhos estão na caixa dos brinquedos, eles se transformam em órgãos de prazer: brincam com o que vêem, olham pelo prazer de olhar, querem fazer amor com o mundo.
Os olhos que moram na caixa de ferramentas são os olhos dos adultos. Os olhos que moram na caixa dos brinquedos, das crianças. Para ter olhos brincalhões, é preciso ter as crianças por nossas mestras.
 
Alberto Caeiro disse haver aprendido a arte de ver com um menininho, Jesus Cristo fugido do céu, tornado outra vez criança, eternamente: “A mim, ensinou-me tudo. Ensinou-me a olhar para as coisas. Aponta-me todas as coisas que há nas flores. Mostra-me como as pedras são engraçadas quando a gente as têm na mão e olha devagar para elas”.
 
Por isso – porque eu acho que a primeira função da educação é ensinar a ver – eu gostaria de sugerir que se criasse um novo tipo de professor, um professor que nada teria a ensinar, mas que se dedicaria a apontar os assombros que crescem nos desvãos da banalidade cotidiana. Como o Jesus menino do poema de Caeiro. Sua missão seria partejar “olhos vagabundos”…
 
 
Rubem Alves – Educador e escritor.
Texto originalmente publicado no caderno “Sinapse”, jornal “Folha de S. Paulo”, em 26/10/2004.
« Última modificação: 25 de Maio de 2023, 11:49:30 por pkawazoe »


Leonardo Tonin

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Resposta #11 Online: 25 de Maio de 2023, 13:59:43
Gosto do modo que você vê.
Das palavras nascem fotos e das fotos nascem palavras.

Gosto desse sentido filosófico que coloca camadas e camadas para iluminar, acordar dessa banalidade que tanto tortura o ser humano.

Gostei muito.

Muito obrigado Paulo.  :worship:


Maneco Pizarro

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Resposta #12 Online: 25 de Maio de 2023, 18:47:02
Ah, essa complicada arte de ver; que texto!
Estou pensando se não são os olhos de ver que quase sempre se impõem aos que brincam, que pouco sabem de regras e obrigações estéticas.
Porque se são, muitas vezes podem ter um julgamento fácil e contido, restrito ao que é tido como certo.
Ou mais que isso... Talvez julguem como errado, aquilo que simplesmente não estão habituados a ver.
Só pensando, aqui...


Pris WerSo

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Resposta #13 Online: 26 de Maio de 2023, 09:15:26
Meninos, quero um pouco desse orégano estragado que tá rolando aqui...  :D
Fotografo para mim, por puro prazer. Li muito, comprei livros, aprendi muito aqui. Comprei câmera superzoom e depois dslr. Troquei por uma melhor, lentes boas... tá na caixa, saindo para voar com os pássaros vez ou outra. Celular virou meu fiel escudeiro. Tá sempre comigo, à mão quando vejo algo que me salta aos olhos. Por isso, discordo educadamente do Leonardo... celular também é fotografia, apesar dos textos que discordam de mim. Não me preocupo mais com as regras. Fotografo. Gosto de fotos subexpostas, borradas, centralizadas... "erradas". Até gosto quando acham legais, curtem, mas não consigo mais pegar o caminho da roça do todo mundo faz... por isso, até sei que minhas fotos não são tão boas quanto eu acho, mas... vida que segue. E segue mesmo e o celular na mão acompanha meu olho que bateu em algo...
Adorei o texto do Rubem Alves, Paulo... adoro Alberto Caeiro... Gratidão...  :wub:


pkawazoe

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Resposta #14 Online: 28 de Maio de 2023, 00:14:15
Gosto do modo que você vê.
Das palavras nascem fotos e das fotos nascem palavras.

Gosto desse sentido filosófico que coloca camadas e camadas para iluminar, acordar dessa banalidade que tanto tortura o ser humano.

Gostei muito.

Muito obrigado Paulo.  :worship:

Obrigado pelo comentário.... :ok: