Eu diria que, por toda a humanindade, artistas em geral foram assim. Hoje em dia a maioria das pessoas é assim, de uma forma ou de outra. Talvez pelo tempo das redes sociais, em que se posta coisas esperando um "Curtir".
Mas eu também acho que nem toda a arte está destinada à grandeza, e está tudo bem com isso. Nós, como humanos, nos organizamos em pirâmides: pra cada mil medíocres (medianos), poderá haver 100 bons, 10 excelentes e um genial. Mas dificilmente o genial seria genial se não existissem os mil medíocres. Tudo bem com isso. Fazendo um paralelo com a música, eu ficaria bem ansioso se toda música que eu ouço fosse uma obra-prima. Aliás, "obra prima" sigifica a primeira, a melhor. Não dá pra tudo ser o primeiro, o melhor.
Quanto a ser autoral, achei simplista a colocação. Pra mim, autoral é somente seguir alguns preceitos daquele personagem que se quer representar. Cada projeto pode ser executado por um personagem diferente do mesmo fotógrafo. Você (Paulo) já mostrou aqui diversos dos seus projetos (personas): teve sua exposição "Conexões", e tem seus estudos de composição. Pra mim, são projetos diferentes, e ambos autorais em estilos diferentes. Novamente fazendo uma analogia com a música, seria o Damon Albarn com o Blur e com o Gorillaz. Duas premissas completamente diferentes. Além disso, tem aquele dia em que a gente sai de casa com horário certinho, pra fazer o feijão com arroz. Eu, pelo menos, também ficaria bem ansioso se toda vez que eu fosse fotografar, me sentisse pressionado a fazer minha obra prima naquele dia.
Pra tirar essa pressão do peito, eu sempre aceito que minha fotografia não é boa. O dia que for boa, não serei eu a primeira pessoa a saber.
Penso de maneira bem particular... Não estou nem aí se gostam ou não das minhas fotos, fotografo para mim, porque eu gosto, mesmo porque não ganho dinheiro com isso (nem nunca quis). Ego é para quem vive de exposição e da opinião dos outros.
Lembrando o óbvio, que a divisão entre o que muitos consideram arte é bem subjetiva, somando com os trilhões de fotos cliché ou simplesmente para registro de momentos ou documentais, tem muito assunto para ser discutido. Obviamente para quem gosta de discutir sobre essas coisas. Eu prefiro me divertir, fotografar o que gosto sem ter que dar satisfação a ninguém e muito menos ligar para as opiniões dos outros.
Mas tem o caso do profissional, que se não for bom no que faz aí ferrou, vira mais uma gota no oceano e isso é meio caminho andado para uma vida profissional completamente frustrada.
E concordo plenamente que tem muitos fotógrafos que se acham e o trabalho realmente é bem mais ou menos, isso para ser educado...
Fotografia autoral demanda conhecimento, domínio da técnica e um contexto, coisa que não tenho visto muito ultimamente. Inclua nisso que gosto é totalmente subjetivo.
O elogio e a critica são importantes, e claro que existem aspectos negativos no ser humano. Tambem e bom entender, que existe competição, mas pode ser saudável, ninguém precisa passar por cima.
O que pra mim, e importante o fotografo ter algum grau de satisfação em seu processo de aprendizado, considerando ter chegado em uma foto boa, em uma primeira camada de percepção. Sem um pouco dessa satisfação, qualquer atividade que requeira disciplina torna se um castigo. O prazer de fotografar o que gosta.
Em uma segunda camada de percepção, temos sim a critica, os conselhos, onde a opinião do outro pode contribuir.Dar algum toque não e fácil, pode incomodar quem esta se expondo. Mas eu nao acho que tenha apenas aspectos negativos. Nao concordando, não de ouvidos. O que eu acredito que o Ivan de Almeida apontou, no entanto e a critica mais vinculada a tecnologia dos produtos, do que ao ensino. No meu entender, esse foi um ponto que fez algumas pessoas abandonar a fotografia, e passou a usar mais o telefone. Por isso, acho importante quando estamos em meios virtuais muito abrangentes, selecionar o que voce pode considerar apropriado para voce e o que nao e dentro da area que voce tem interesse, de acordo com seu modo de pensar.
Acho que dá pra responder todo mundo aqui.....então vamos lá.
Na minha opinião o Ego nunca anda sozinho, ele sempre está acompanhado do orgulho e da vaidade, quando produzimos uma imagem que a gente gosta de uma certa maneira dá um pouco de orgulho e a nossa vaidade nos impulsiona para mostra lá para alguém e o ego tem a expectativa do elogio, isso não é só com a fotografia mas com coisas do nosso cotidiano, como um texto que escrevemos, ou algo que a gente conserta em casa, ou aquela ideia no trabalho, etc
Mas eles em si não são propriamente ruins, dependendo do contexto em que eles são aplicados, e podem ser a força que impulsiona a sua fotografia. E isso está ligado a jornada fotografia de uma pessoa. Nós passamos por várias fases ao longo do nosso caminho, tem a descoberta da fotografia, o aprendizado, os projetos e depois mais aprendizados, ai a gente descobre que não sabe muito e volta para o aprendizado, e em todo esse tempo a gente faz fotografias ruins, boas e excelentes e depois descobre o que o bom era ruim e o excelente era mais ou menos, e o ego, a vaidade e o orgulho? Eles sofrem mais ou menos dependendo da maturidade em que a gente se encontra.
O quão bom nós nos tornamos não depende exclusivamente da quantidade de informação que nós temos, repertório não é o mais importante na fotografia.
Talvez uma outra coisa que a gente adquire durante a nossa jornada.
Vou deixar mais um texto, um do Rubem Alves que explica o que eu penso.
A COMPLICADA ARTE DE VER
Ela entrou, deitou-se no divã e disse: “Acho que estou ficando louca”. Eu fiquei em silêncio aguardando que ela me revelasse os sinais da sua loucura. “Um dos meus prazeres é cozinhar. Vou para a cozinha, corto as cebolas, os tomates, os pimentões – é uma alegria!
Entretanto, faz uns dias, eu fui para a cozinha para fazer aquilo que já fizera centenas de vezes: cortar cebolas. Ato banal sem surpresas. Mas, cortada a cebola, eu olhei para ela e tive um susto. Percebi que nunca havia visto uma cebola. Aqueles anéis perfeitamente ajustados, a luz se refletindo neles: tive a impressão de estar vendo a rosácea de um vitral de catedral gótica.
De repente, a cebola, de objeto a ser comido, se transformou em obra de arte para ser vista! E o pior é que o mesmo aconteceu quando cortei os tomates, os pimentões… Agora, tudo o que vejo me causa espanto.”
Ela se calou, esperando o meu diagnóstico. Eu me levantei, fui à estante de livros e de lá retirei as “Odes Elementales”, de Pablo Neruda. Procurei a “Ode à Cebola” e lhe disse: “Essa perturbação ocular que a acometeu é comum entre os poetas. Veja o que Neruda disse de uma cebola igual àquela que lhe causou assombro: ‘Rosa de água com escamas de cristal’. Não, você não está louca. Você ganhou olhos de poeta… Os poetas ensinam a ver”.
Ver é muito complicado. Isso é estranho porque os olhos, de todos os órgãos dos sentidos, são os de mais fácil compreensão científica. A sua física é idêntica à física óptica de uma máquina fotográfica: o objeto do lado de fora aparece refletido do lado de dentro. Mas existe algo na visão que não pertence à física.
William Blake sabia disso e afirmou: “A árvore que o sábio vê não é a mesma árvore que o tolo vê”. Sei disso por experiência própria. Quando vejo os ipês floridos, sinto-me como Moisés diante da sarça ardente: ali está uma epifania do sagrado.
Mas uma mulher que vivia perto da minha casa decretou a morte de um ipê que florescia à frente de sua casa porque ele sujava o chão, dava muito trabalho para a sua vassoura. Seus olhos não viam a beleza. Só viam o lixo.
Adélia Prado disse: “Deus de vez em quando me tira a poesia. Olho para uma pedra e vejo uma pedra”.
Drummond viu uma pedra e não viu uma pedra. A pedra que ele viu virou poema.
Há muitas pessoas de visão perfeita que nada vêem.
“Não é bastante não ser cego para ver as árvores e as flores. Não basta abrir a janela para ver os campos e os rios”, escreveu Alberto Caeiro, heterônimo de Fernando Pessoa. O ato de ver não é coisa natural. Precisa ser aprendido.
Nietzsche sabia disso e afirmou que a primeira tarefa da educação é ensinar a ver. O zen-budismo concorda, e toda a sua espiritualidade é uma busca da experiência chamada “satori”, a abertura do “terceiro olho”. Não sei se Cummings se inspirava no zen-budismo, mas o fato é que escreveu: “Agora os ouvidos dos meus ouvidos acordaram e agora os olhos dos meus olhos se abriram”.
Há um poema no Novo Testamento que relata a caminhada de dois discípulos na companhia de Jesus ressuscitado. Mas eles não o reconheciam. Reconheceram-no subitamente: ao partir do pão, “seus olhos se abriram”.
Vinicius de Moraes adota o mesmo mote em “Operário em Construção”: “De forma que, certo dia, à mesa ao cortar o pão, o operário foi tomado de uma súbita emoção, ao constatar assombrado que tudo naquela mesa – garrafa, prato, facão – era ele quem fazia. Ele, um humilde operário, um operário em construção”.
A diferença se encontra no lugar onde os olhos são guardados. Se os olhos estão na caixa de ferramentas, eles são apenas ferramentas que usamos por sua função prática. Com eles vemos objetos, sinais luminosos, nomes de ruas – e ajustamos a nossa ação. O ver se subordina ao fazer. Isso é necessário. Mas é muito pobre.
Os olhos não gozam… Mas, quando os olhos estão na caixa dos brinquedos, eles se transformam em órgãos de prazer: brincam com o que vêem, olham pelo prazer de olhar, querem fazer amor com o mundo.
Os olhos que moram na caixa de ferramentas são os olhos dos adultos. Os olhos que moram na caixa dos brinquedos, das crianças. Para ter olhos brincalhões, é preciso ter as crianças por nossas mestras.
Alberto Caeiro disse haver aprendido a arte de ver com um menininho, Jesus Cristo fugido do céu, tornado outra vez criança, eternamente: “A mim, ensinou-me tudo. Ensinou-me a olhar para as coisas. Aponta-me todas as coisas que há nas flores. Mostra-me como as pedras são engraçadas quando a gente as têm na mão e olha devagar para elas”.
Por isso – porque eu acho que a primeira função da educação é ensinar a ver – eu gostaria de sugerir que se criasse um novo tipo de professor, um professor que nada teria a ensinar, mas que se dedicaria a apontar os assombros que crescem nos desvãos da banalidade cotidiana. Como o Jesus menino do poema de Caeiro. Sua missão seria partejar “olhos vagabundos”…
Rubem Alves – Educador e escritor.
Texto originalmente publicado no caderno “Sinapse”, jornal “Folha de S. Paulo”, em 26/10/2004.