Este assunto é sempre pertinente, sempre é hora de ser levantado.
Em muitos casos o "registrar" tem seu valor, por exemplo quando o é algo que só se encontra pra fotografar indo a lugares distantes e inóspitos. Ou quando se coloca o pescoço em risco. Claro, são valores que em geral nao aparece mna imagem, estão nas explicaçoes ("Caminhei por 12 horas pra chegar a este lugar". Mérito fotográfico, embora não entre na "arte" da coisa.
Aqui tem um exemplo meu mesmo, da questão "pescoço em risco":
http://www.flickr.com/photos/xiru/3483811531/A foto tem lá algum valor que EU coloquei ali: o enquadramento, a fotometria evitando total silhueta. E mais algum "valor" (ou idiotice, conforme o ponto de vista) que não aparece na imagem, o se colocar em risco de o motoqueiro errar o salto e cair em cima de mim.
Sinceramente, é pouco, por isto coloquei o título "É só pressionar o disparador...", porque o mérito desta imagem, o que chama atenção ali, é algo de total responsabilidade da Nikon, da câmera. Eu só fui alí e, usando a abordagem do "Filosofia da Caixa Preta", fiz o que estava no "programa" da câmera. Alias, qualquer foto, por mais tecnicamente audaciosa e inovadora que seja, só faz o que está no programa da câmera. Dai que concordo com o Ivan: (quase sempre**) é na narrativa que o fotografo deixa sua marca, seu papel, sua
criação.
O "**" do quase sempre se explica nas palavras do Leo Terra: "Penso que mesmo quando nos entregamos ao objeto temos um carater arbitrário do fotógrafo, que se constitui em um diferencial, mesmo que sutil."
Curiosamente (ou nem tanto...), é a foto que mais recebeu comentario, do meu flickr. E, ao contrario das outras, não coloquei em nenhum grupo nem nada onde pudesse ser vista por estranhos. E foi, bem acima da minha média. (apesar de que no flickr, que uso pouco, ainda nao coloquei minhas fotos que realmente gosto, que considero as mais elaboradas, construidas)
Ou Seja, não é só o foógrafo que constantemente se prende demais ao objeto: é o que as pessoas "gostam". Nçao que não gostem de 'narrativas', mas estas foto-objeto são,como ja falamos várias vezes, mais faceis de serem digeridas. E, na comunicação em massa, infelizmente é isto que prevalece, faz sucesso.
Cabe a quem acha isto um problema (muitos de nós aqui), buscar o contrário. Pra deixar algo de mais valor no mundo, e pra realização pessoal, se isto te realizar.
Enfim, a foto que dei de exemplo não é lá grandes coisas. É um registro definitivamente, e não acresce nenhum valor a "Arte Fotografica", ou coisa do gênero. Mas diversas fotos assim, quase que como um grupo, acrescentam algo à "Cultura Fotografica", ao mundo de possibilidades que temos.
Agora, sobre a frase final:
"É na narrativa que a fotografia ganha autonomia e torna-se diferente de uma pura reprodução de algo."É neste ponto que seguido toco, conversando sobre as fotos de amigos (num fórum de grupo de amigos que estamos formando aqui na região). Elogio quando percebo que houve esta criação, e ainda mais quando criou algo que (pra mim) foi sensibilizante. E sugiro atenção nisto quando sinto falta. Isto é bom, porque realmente em geral as pessoas (todos nós) se fascinam com a "capacidade registradora" da câmera e se cegam pro "além-da-câmera", ou "além-do-assunto". E constantemente tento usar durante o meu ato fotográfico.
Como diz o Manoel de Barros:
Aprendi com Rômulo Quiroga (um pintor boliviano):
A expressão reta não sonha.
Não use o traço acostumado.
A força de um artista vem das suas derrotas. Só a alma atormentada pode trazer para a voz um
formato de pássaro.
Arte não tem pensa:
O olho vê, a lembrança revê, e a imaginação transvê.
É preciso transver o mundo.
Isto seja:
Deus deu a forma. Os artistas desformam.
É preciso desformar o mundo:
Tirar da natureza as naturalidades.
Fazer cavalo verde, por exemplo
Fazer noiva camponesa voar – como em Chagall.
Agora é só puxar o alarme do silêncio que eu saio por
aí a desformar. (...)