O fotógrafo tcheco Ivars Gravlejs desenvolveu, durante um ano e em segredo, um projeto de arte contemporânea enquanto era repórter fotográfico do jornal Deník. Ele manipulava sistematicamente detalhes de suas fotos antes de enviar para publicação, e depois criou uma exposição com os recortes de jornal contrapostos às fotografais originais. O trabalho é extremamente interessante e relevante, uma vez que estamos vendo uma mídia histérica com o Photoshop que insiste em vender a imagem da fotografia como reflexo da realidade.
O próprio autor descreve o projeto "My Newspaper":
"Todos os dias eu recebia, de editores e jornalistas, a incumbência de fotogravar eventos em Praga. Antes de enviar as fotos para o banco de imagens do jornal, eu rapidamente as manipulava no Photoshop. Originalmente, a idéia era mudar alguns detalhes pequenos e desimportantes, que não alteraria muito o conteúdo da fotografia, como por exemplo adicionar mais botões na camisa de um escritor ou adicionar uma pichação na parece. No entanto, durante o processo, houve algumas mais radicais, como criar um congestionamento numa estrada ou cortar o dedo do cantor José Carreras. O objetivo desse projeto foi criar manipulações absurdas a partir das manipulações da mídia."
O artista Milan Mikuláštík comenta o trabalho de Gravlejs:
"O projeto é um exemplo típico de 'arte subversiva'. É uma arte que parasita o tema concreto e afeta, sabota e critica esse tema (no caso a sociedade midiática). Por um lado, Ivars Gravlejs desconstrói a autoridade do negócio midiático, desconstrói a autenticidade e a objetividade da informação (que é, de qualquer forma, já midializada e interpretada), mas por outro lado ele contempla a situação do artista contemporâneo, que frequentemente precisa suspender seu processo criativo a fim de ganhar dinheiro para viver. Gravlejs cuidadosamente 'contrabandeou' sua arte na sua atividade 'não artística' diária."
Sobre o exemplo acima, o artista descreve:
"No dia 31 de agosto eu deveria fotografar um congestionamento. Fui até o local, mas não havia congestionamento. Para fazer a foto, eu poderia jogar um tijolo na estrada ou escolher a maneira menos dolorosa — ir para casa e fazer a foto em paz. Os assuntos mais importantes para o jornal 'Deník' eram congestionamentos, ruas e parques sujos, moradores de rua, estrangeiros e o tempo."
Isso nos leva a refletir sobre a cadeia de produção de informações. O fotógrafo precisa fazer uma foto que satisfaça o repórter, que segue uma linha editorial feita para agradar os leitores do veículo. Quem faz finge dizer a verdade e quem lê finge acreditar. E quando alguém expõe a artificialidade do processo (e a fotografia jornalística é uma entre diversas artificialidades tomadas como verdades), há uma reação histérica em defesa da objetividade e da imparcialidade santa dos meios de comunicação.
Mais no site do artista:
Ivars Gavlejs.